A PÁTRIA DOS GRANDES CACHORROS

Guardando os mesmos dois passos que separam o Príncipe Philip de sua patroa e rainha, a dupla de guarda-roupas (e costas) não impediu a abordagem pela cinquentona de legging lilás, na democrática caminhada matinal, ao distinto, lépido e faceiro cavalheiro.

Na interrupção do fluxo dos apressados transeuntes, a entrega de um envelope pardo foi precedida de uma rápida exposição do seu conteúdo, com todos os indícios de tratar-se  de um  curriculum vitae.

As taxas de desocupação, antes apelidadas desemprego, explicam o que a imaginação não deixa de desenhar.

A ex-atleta, ainda semi-sarada, só podia estar apresentando, em segundos, sua história e vida.

Ter trabalhado como vendedora ou caixa em outras empresas, embalava o sonho de ser supervisora em qualquer  setor do supermercado da família de quem, de tão valioso, andava sob proteção dobrada.

A não ser se estivesse na busca do primeiro emprego para alguma  filha, que tendo completado curso superior, aceitava trabalho com menos exigências, mesmo  com salário baixo, contanto que encontrasse um lugar no mercado.

Inspiração é o que não falta, tantos são os exemplos de grandes empresários e magnatas que começaram no chão da fábrica ou em filas de office boys, e chegaram ao paraíso dos CEOs.

Está enraizado na cultura, tatuado no DNA.

Não tem jeito.

Mesmo que nos  pequenos negócios  e nas  corporações, o processo seletivo impessoal seja adotado, sempre se espera que haja uma força  mais forte e salvadora  que mostre o caminho mais curto para o departamento de pessoal .

Estamos sempre esperando soluções que venham de cima. Falar com quem resolve. O manda-chuvas e tudo o mais que caia do céu.

Somos uma nação fadada ao comando único. Poder centralizado. Monárquico ou presidencialista.

De preferência, sob régio de um salvador da pátria.

A solução parlamentarista,  apontada para todas as mazelas e crises políticas, das vezes que foi testada, não deu certo.

Antiemético para engolir Jango em 1961, não durou dois anos e acabou no que poucos ainda  têm saudade.

Não foi por falta de experiência. Os últimos 42 dos 58 anos do império de Pedro II, também acabaram em golpe.

Republicano.

Como tudo é hoje, quando feito às claras, sob a égide da Justitia.

Na cooperativa, onde as decisões são colegiadas, compartilhadas por estatuto e natureza, a usuária impaciente, depois de não ter seu caso resolvido  pelos técnicos e já haver passado pela última instância da supervisão geral, sabendo que existia um cargo de presidente, finalmente resolveu seu problema.

Antes, abriu o berreiro na antessala, dispensando os préstimos da elegante e estupefata secretária:

–Só saio daqui quando falar com o cachorro grande.

É conversando que a gente se entende.