18 de abril de 2024
JudiciárioMemória

LEMBRANÇAS DAS TRANSAÇÕES SUSPEITAS

 

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O Cambiteiro (1961) – Vicente do Rego Monteiro – 1961 – Acervo da Fundação Joaquim Nabuco, Recife


O
smartphone sempre surpreendente, revelou mais  uma das suas mil utilidades.

Mostrou-se melhor que qualquer outro método para testar os corações que já batem fora do ritmo.

Bastou um simples telefonema (alguns aparelhos ainda têm esta função) da secretária presencial doméstica.

A duração do exame é o tempo de deslocamento entre o local onde os afazeres ficam para depois, a casa,  e a leitura do documento deixado em  domicílio, pelo Ministério Público.

Uma notificação com prazo de cinco dias para comparecer à Promotoria de Canguaretama, e prestar esclarecimentos.

Assunto: investigação criminal com o objetivo de averiguar ilicitude na compra e venda de fazenda em Sagi, em que um senhor, de longo nome espanhol,  e o ex-secretário estadual de saúde, estariam firmando “transações suspeitas”.

Nome e endereço do ex, conferidos.

Qualificação, idem. Que do cargo ocupado por 1/69 dos anos vividos, ninguém consegue tirar a inhaca.

Local da ocorrência, conhecido em viagem de lazer.

Há bons vint’anos, em passeio pela beira-mar, de buggy, até a boca do Guaju.

Nenhuma recordação se as terras eram agricultáveis ou serviam para criação de zebuínos.

Só relatos de uns índios tabajaras por perto.

Do vendedor (ou comprador), nem a menor e vaga lembrança.

A memória claudica.

Em busca do elo perdido, qualquer maneira de achar, vale a pena.

Consulta ao fichário da clínica, com muitos estrangeiros, quedou sem registro.

Uma hackeada pelo Google, e surge homônimo, como parte de processo na Justiça Federal envolvendo questões e rolos de loteamentos.

Seguindo a pista, qual um greenwald caboclo, talvez fosse o ibérico, um vizinho ainda não apresentado. Sempre há um rastro. Vai ver, deram o endereço do gringo com o número da casa, trocado.

Debalde.

Ou sabe-se lá, em alguma carraspana na Barra do Cunhaú, embriagado de súbita riqueza, pudesse ter botado preço em alguma ganaderia por perto.

Até mesmo um anúncio fúnebre de quatro anos atrás, em Larrabetzu, província de Biscaia, País Basco, foi encontrado.

Outro Dom José Ignácio com tantos outros múltiplos apellidos iguaizinhos?

Em tempos de domínio do fato, tudo é possível.

Até comprar propriedade de defunto.

Com as informações recolhidas, as providências práticas para a audiência.

Pilates e agenda de trabalho de quase aposentado, cancelados.

Companhia para a viagem, acertada com sobrinho (de verdade).

Num rasgo de lucidez, refletindo como um Mané, a constatacão.

– Sou casado mas não me chamo Joaquim. Nem moro em Niterói.

Um respeitoso ofício eletrônico solicitando a transferência da oitiva para a capital, deu resultado.

No reply :

“Em verificação ao procedimento, analisando folha por folha, percebemos que realmente houve um infeliz equívoco e que a notificação era para outra pessoa, não havendo nos autos menção sobre o seu nome. Pedimos desculpas pelo incômodo e informamos que pode desconsiderar a notificação.”

As coronárias agradeceram.

(Um susto grande, a gente até que esquece.              A menos que o Facebook relembre o que foi publicado em 17/08/2019)

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O Vaqueiro (1961) – Vicente do Rego Monteiro – 1961 – Acervo da Fundação Joaquim Nabuco, Recife

2 thoughts on “LEMBRANÇAS DAS TRANSAÇÕES SUSPEITAS

  • Geraldo Batista de Araújo

    Comentário pertinente

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    • Domicio Arruda

      Parabéns. Professor.
      Saúde!

      Resposta

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