NOSSO GENOCIDA FAVORITO
A eleição de Barack Obama que poderia ter sido o ponto final no assunto, aumentou ainda mais o debate se os afro-americanos já estariam compensados pelas atrocidades sofridas.
Nem o premiadíssimo filme Lincoln, de Steven Spielberg, pode ser responsabilizado pela onda de revisionismo histórico que explodiu com a morte de George Floyd, por policiais brancos, numa rua de subúrbio em Minneapolis.
O que seria um protesto de moradores contra a violência policial e o pedido de justiça para os envolvidos no crime, ganhou outras praças, avenidas e cidades.
Correu o mundo, ecoando uma frase que dispensa traduções.
Black lives matter.
A história continuou a ser recontada. O herói que venceu a guerra e reunificou a nação, também estava sendo julgado por ter estimulado a exportação do problema racial para países do Caribe e até fronteiras mais distantes, como o Brasil.
A simpatia pela política de apoio a companhias norte-americanas para adquirir terras em lugares geoestratégicos e para lá mandar os negros libertos, mantendo longe dos espaços reservados, guetos e moçoilas louras, a mão-de-obra essencial ao cultivo de produtos que preferiam importar.
Monumentos já foram vandalizadas e homenagens retiradas de presidentes escravocratas.
Generais antes glorificados pelas conquistas de territórios índios, estão tendo suas patentes rebaixadas e estrelas apagados das placas de ruas e frontispícios de prédios públicos.
Nem nas selas das estátuas equestres, se equilibram mais.
Na pindorama tropical, ainda vige a anistia irrestrita aos crimes que o passado condena.
Em nome da tradição e do perdão conferido pelo tempo, o senhor de meia dúzia de escravos ainda conserva a corda, o nó e a forca que o levaram ao panteão dos heróis da pátria independente.
Nos caminhos que unem os extremos da cidade dividida em norte e ricos, uma avenida de quase seis quilômetros.
Homenagem, em batismo coletivo, aos governadores-gerais da Capitania do Rio Grande em letreiros de ruas antes numeradas.
Subordinada a Pernambuco, a ex-província foi governada, por cinco anos, pelo mor-capitão Bernardo Vieira de Melo, filho de militar, senhor de engenho.
O cargo no topo da hierarquia das milícias foi auferido como recompensa pelo desempenho contra os amotinados de Palmares.
Pelo interior, em terras secas e vales verdejantes, deixou rastro e obras marcantes.
Na sua opereta, resplandece a fundação do Arraial de Nossa Senhora dos Prazeres, hoje com afeto e assúcar, Açu.
Seu perfil de pacificador é desenhado à pena em vermelho rutilante e na obra de fortificações e presídios.
As medalhas de honra ou mérito, todas recebidas em reconhecimento à bravura de missões espinhosas e perversas.
Na Serra da Barriga, socorreu o sargento, comandante das tropas leais, em apuros.
Vitórias, louros e glória que não sepultam os mais de quatrocentos negros fugitivos, recapturados e condenados à pena capital, pela sentença do juiz implacável.
Depois de suas incursões expansionistas pelo território inóspito, da nação tapuia, sobraram poucos na tribo Janduis.
Todos cristãmente pacificados.
Homem bem à frente do tempo, no Senado da Câmara de Olinda, foi dele o primeiro pronunciamento republicano em terras imperiais, 180 anos antes do primeiro golpe militar.
A ousadia retórica custou-lhe a prisão e o degredo, junto com um filho, para Lisboa, onde morreu no cárcere.
No capítulo potiguar desta biografia a ser revista e reeditada, tem um espaço reservado para outro capitão.
De empresa.
Vc tem razão em lembrar a apropriada substituição do nome da Avenida Bernardo Vieira.