24 de abril de 2024
Comportamento

O GRANDE JOGADOR

 

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Estórias hilárias de tipos marcantes, se repetem, trocando apenas os lugares onde aconteceram. As mesmas ocorrências em diferentes cidades.

Tributino era diferente. Nômade, não deixava que seus pequenos golpes fossem conhecidos.

De repente, desaparecia.

E num passe de mágica, era visto onde mais estivesse rodando os números da riqueza.


(Publicação original em 12/10/2019)


GOLPE DE SORTE

Para o menino curioso, aquele senhor irradiava mistério. Só podia ter algum superpoder, mágico.

Um mandrake de roupas brancas,  iludindo o agreste.

Ninguém sabia ao certo mas dizem que era das bandas de Macau. Aparecia de vez em quando e sempre nas festas de fim de ano, na quermesse da paróquia e  campanhas eleitorais.

Circulando entre as barracas do resplandecente cassino a céu aberto, armado na rua grande.

Divinos vícios, invisíveis à lei, permitidos pela santa causa e abençoados pelo pároco.

Bem vestido, paletó de  linho branco, engomado, sapatos de duas cores, cabeleira alva, penteado armado em pasta de brilhantina. Chapéu ramenzoni à mão para alguma necessidade.

Na faixa dos 60.

Parecia conhecer todo mundo  e ser velho conhecido dos não jovens .

Com fama de sabido, entendia de tudo.

No inconsciente coletivo, um irresistível vivaldino.

Na noite animada, a roleta girando solta, muitos apostadores e  uma plateia dos que já não tinham mais o que gastar e outros tantos,  criando coragem para botar toda a fé no número da sorte.

Tributino foi chegando com jeito de quem nada queria. Além de apreciar o balé e a sinfonia do monte de fichas sendo empilhadas, derrubadas, misturadas às dos perdedores e entregues aos sortudos ganhadores.

Ou recolhidas pelo rolo do dealer na zero roleta.

Com gestos, caras, bocas e trismos , demonstrava aos circunstantes que também participava de cada sorteio.

Num jogo particular, silencioso, imaterial.

Nos sorrisos de satisfação, os poucos momentos de  alegria pelo pequeno ganho; nas carrancas, a decepção das muitas perdas.

A empatia com os jogadores de verdade foi evoluindo até o ponto da aceitação tácita  no embate imaginário.

Que ganhava ou perdia , sem precisar ao menos comprar nem depositar fichas.

Passou a entregar ao croupier o dinheiro correspondente ao que dizia ter apostado em pensamento. E perdia. Sempre em valores pequenos.

A banca animada com a sequência de rodadas desfavoráveis ao agora fiel apostador, aceitava de bom grado.

Até que o discreto jogador deu um soco no ar e falou para todos que vinham acompanhando sua sequência de infortúnios que a sorte finalmente bafejara em seu favor.

Que naquela rodada havia jogado todas as fichas, fictícias, num lance reto e era  merecedor de um prêmio de 35:1

Bolinha parada, apostas suspensas e caso pra ser resolvido pelo delegado.

Ou pelo padre.

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