PARADISO AGRESTE
A lembrança de um menino maravilhado com o mundo do cinema projetou na pequena cidade do agreste potiguar, semelhanças com outras terras distantes.
O que tem em comum o interior potiguar e o da italiana Sicília?
Pelo menos, terras áridas, vegetação rasteira e sol inclemente, mas suas vilas e cidades como eram há cinco ou seis décadas, podem guardar mais similitudes que se possa imaginar.
Cenários e elenco de um mesmo filme.
Nuovo Cinema Paradiso, que imortalizou personagens e ganhou um Oscar, tem uma versão afetiva brasileira.
Basta que se dê asas e liberdade à imaginação.
Nas ribeiras do Curimataú, de algum Totó não se tem notícias, mas Alfredo, o projecionista, Nova Cruz sabe muito bem quem foi.
Paulo Bezerra.
Empreendedor visionário, arrojado e polimorfo.
Além dos audiovisuais, manteve negócios nos ramos do comércio de mercearia, tipográficos, de destilaria e enchimento de bebidas.
Mas a jóia da coroa do seu império agrestino foi o Cine Éden.
Seu, e de todos, paraíso.
Edifício imponente, pé direito alto e paredes escuras. Uma diminuta antessala de cortinas pesadas dava acesso a duas entradas.
A clientela podia optar entre platéia de primeira, de confortáveis poltronas não acolchoadas e de segunda, nas filas dos bancos sem encostos, mais próxima do écran.
Havia a possibilidade de se pagar ainda menos e assistir ao filme, meio enviezado, em pé, do corredor lateral.
Não só a entrada, o comportamento dos cinéfilos também era controlado pelo proprietário.
Advertências e até cartões vermelhos para os inconvenientes, segundo peculiar manual de conduta que proibia assobios e comentários picantes.
Não precisa nem dizer quem era o ouvidor geral para críticas, sugestões e principalmente, reclamações.
Quando foram pedir providências contra aqueles quase invisíveis insetos, cujas picadas além das marcas na pele, tiravam a concentração no filme, não fugiu das suas responsabilidades, décadas antes do código de direitos do consumidor:
As pulgas têm o carimbo do Cine Éden?
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Ouça o tema final da trilha musical Cinema Paradiso, de Ennio Morricone (1928-2020)
Cinema Paradiso “soundtrack final” “Tema finale” “final theme”
(Reprise de publicação de 19/04/2019)