QUERIDO DIÁRIO
O plano estratégico era seguir a sugestão dos manuais de sobrevivência no bunker doméstico, enquanto ouvimos o toque de recolher da guerra que devasta outros palcos.
Atento.
Forte.
Com muito tempo pra temer.
Por que não começar um diário?
Registrar tudo que se passa e passa pela cabeça. E o que é resgatado da memória.
Lembranças, faltas, desejos, convicções, ausências, medos, incertezas, mudanças.
Um dia alguém haverá de ler. E entender.
A estratégia de começar logo cedo, mais uma vez adiada. A vida que segue, não dá trégua.
Nem tudo é maravilhoso. Nem divino.
O post agendado de véspera, recebe um comentário e no primeiro bom-dia, a crítica mordaz.
–Hoje, fiquei na missa sem ver o padre. Não entendi nada.
O leitor da madrugada ainda lembrou que era filho de agricultor, como se um engenheiro bem sucedido não tivesse suas próprias experiências gastronômicas.
Logo ele, caixa-alta que parece entender tudo dos brunelos, capelinhas e borgonhas.
Podia ser o mote pra lembrar outras delícias que vão ficando mais gostosas quanto mais inesquecíveis.
E de vinhos que não sabemos, terão o mesmo bouquet nos dias que virão.
Um banquete.
Lefse, moussaka, baklava, pinot noit.
Mas aí, a trabalheira pra explicar o que é pão, salgado, doce, líquido.
O que lembra a Noruega e a Grécia. Ou será França, ou Turquia?
Melhor, procurar notícia boa na caixa de e-mail.
Jornalista em disponibilidade, lembrou da matemática do ginásio em Jundiaí e manda para os amigos e conterrâneos, os números que não ganham destaque nas estatísticas do avanço da pandemia no país em vertigem.
Pelas contas de Flamínio d’Oliveira, os números são os mesmos mostrados na TV. Sem pessimismo nem desesperança.
–De fato, esse registro negativo está correto, é real. No entanto, a reportagem não enfocou e omitiu a parte positiva verificada no mesmo período, quando a média de novos contaminados e do número de óbitos caiu.
A manhã nem foi rendida pelo almoço, marcado para o encontro dos ponteiros e tantos dramas individuais invadem a telinha, janela para o mundo, que é melhor deixar pra remexer nas emoções, depois.
Adianto o título.
Meu diário no paraíso.