“Tomar dinheiro de miseráveis era coisa comum no tempo da escravidão”
Elio Gaspari faz uma breve- e consistente – análise da novidade da equipe econômica do Governo Bolsonaro sobre gerar receitas com base em taxação de benefícios a desempregados.
Parece reinventar a roda, quando ninguém pensou nisso antes.
Amanhã, no programava Roda Viva da TV Cultura, um dos entusiastas da novidade, o Secretário Rogério Marinho deverá explicar melhor o que , pelo texto de Gaspari, parece absurdo…
O doutor Paulo Guedes garantiu a sua presença nos anais da ciência econômica: propôs a taxação dos desempregados para financiar um programa de estímulo ao emprego.
Não se conhece iniciativa igual no mundo, nos séculos afora.
Pela proposta da ekipekonômica, os brasileiros que recebem o seguro-desemprego, que vai de R$ 998 a R$ 1.735, pagarão de R$ 75 a R$ 130 como contribuição previdenciária.
O sujeito perdeu o emprego, não tem outra renda, pede o benefício, que dura até cinco meses, e querem mordê-lo em 7,5% do que é pouco mais que uma esmola.
Se isso fosse pouco, no mesmo pacote a ekipekonômika desonerou os empregadores que aderirem ao programa do pagamento de sua cota previdenciária de 20%.
Tinha razão o poeta Augusto dos Anjos, “a mão que afaga é a mesma que apedreja”, mas o doutor Paulo Guedes afaga para cima e apedreja para baixo.
Tomar dinheiro dos miseráveis era coisa comum no tempo da escravidão.
Em 1734, para combater “a ociosidade dos negros forros e dos vadios em geral” a Coroa cobrava quatro oitavas de ouro a cada bípede livre que vivia na região das minas.
Em 1835 a Assembleia da Bahia tomava dez mil réis de todos os negros libertos nascidos na África. Esse imposto rendia um bom dinheiro, algo como 7,6% do orçamento da província. Eram tungas de outra época.
No século XXI, a ekipekonômica de Guedes quer arrecadar R$ 11 bilhões em cinco anos com argumentos mais refinados e cosmopolitas.
Como o programa de estímulo ao emprego (e à propaganda oficial) gera despesa, deve-se indicar uma fonte de receita para custeá-lo.
Sob o céu de anil deste grande Brasil, os doutores miraram no bolso dos desempregados que conseguem acesso ao seguro, um benefício restrito aos trabalhadores do mercado formal.
Realmente, não enxerga quem é cego.
Que se traga algo novo, mas até agora, sem paixões estúpidas extremistas, taxar quem está desempregado é de uma perversidade atroz. O que não surpreende o abraço de Rogério Marinho, o grande papa potiguar de conhecimento econômico, ao assunto.
O ex-deputado federal, rejeitado pós-reforma trabalhista, necessária mas cruel, tem a missão de criar uma classe social abaixo da miserabilidade. Ele está no caminho certo. Empresários acima de tudo, Deus só de olho, estupefato.