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TSUNAMI NO SERTÃO

A Grande Onda de Kanagawa (1830) – Katsushika Hokusai – Exemplares desta xilogravura estão expostos no Museu Guimet (Paris), no Museu Metropolitano de Arte de Nova Iorque, no Museu Britânico e na Biblioteca Nacional da França.


Os devotos de
Santo Antônio Conselheiro decifraram o divino sinal, e já não escondem que o fim da espera está próximo.

Nostradamus havia descrito a chegada da Pandemia e do Anticristo.

As duas desgraças, com os dias contados em vacinas e impeachment, realinham  os astros e anunciam a profecia de outro beato, Glauber Rocha, o  visionário de Vitória da Conquista.

A fé recebeu a força que faltava, das ciências ocultas e da vulcanologia, e poucos ainda duvidam que chegou a hora e a vez de o sertão virar mar.

É questão de dias.

As caldeiras da Cumbre Vieja nas franjas da ilha de Palma de Santa Cruz de Tenerife estão aquecidas.

Depois que o velho cume tombar, como uma onda havaiana, o mar vai invadir as  terras do sertão e do cerrado.

Só quem habita o planalto central poderá contar a estória.

Pelos presságios registrados,  a  nação a ser refundada pelos que restarem, não terá futuro auspicioso.

Triste Bahia, quão semelhante Brasil.

Há duas décadas, quando caminhava pelas areias alvas das praias onde acaba o mar dos macacos, cercanias  da cidade que já foi de Filipe e de Frederik, um sertanejo, trocando o ardume da sua terra seca  pelo calor do areal esturricado e salgado, sentiu estranha vibração .

Naquele mormaço, um pressentimento mudou a vida de quem estava ali  para um punhado de dias de doce descanso.

Foi uma visagem tão clara, que pareceu real.

No sonho de olhos abertos,  a parede d’água, coisa maior que cinco braças, varria tudo. Todas as casas e até prédios de poucos pavimentos ficavam debaixo d’água.

Ainda não refeito do transe, correu pra reunir mulher e filhas. No apartamento de primeiro andar que havia comprado por insistência delas, contou a aparição.

Comparou a quimera do outro mundo com uma tromba d’água capaz de  arrombar um  açude do tamanho do Barra, que segura as águas do Velho Chico, na chegada  mansa em Sertânia.

Ainda passou uma quinzena de sobressaltos e sono maneiro.

Nem o barulho ritmado das marés enchentes e vazantes, trazia calma.

Passados os anos, a patroa, as herdeiras e candidatos a genros, continuavam a chegar como aves de arribação, a tempo de pular as sete ondas e ofertar prendas à Rainha Iemanjá.

Por precaução e certo pavor, o chefe do clã nômade, nunca mais voltou a sentir o ar salitroso na vizinha Paraíba.

Aos amigos de longe, mandava lembranças e notícias de progressos nos negócios.

Aos de perto, dava conselhos para ficarem afastados  do perigo.

Recomendações desprezadas pela família, hoje separada por mais de 300 km e por um casamento desfeito e multiplicado por dois.

O poder destruidor de um tsunami começa muito antes do que se possa imaginar.

Que a ira das Canárias passe rápido.

Como um verão em Cabedelo.

Fuji Vermelho (1832) – Katsushika Hokusai – Museu de Belas Artes,Boston

Praias  de Tago Bay, Ejiri em Tokaido (1832) – Katsushika Hokusai – Museu Metropolitano de Arte de Nova Iorque

 

Da série, Trinta e seis vistas do Monte Fuji (1832) – Katsushika Hokusai – Museu Metropolitano de Arte de Nova Iorque

 

Onda Feminina (1845) – Katsushika Hokusai – Museu Hokusai, Tóquio

 

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