ATÉ QUE ENFIM, QUASE UNÂNIMES
A lição de mais de três milênios que vem sendo repetida pelas gerações que sucederam os gregos das assembleias populares, está sendo passada a limpo.
Esqueçam a régua e o compasso. Concentrem-se em mouses e teclados.
Mas cuidado na esquina. O sinal pode fechar para nós que fomos jovens de ideias longas.
A infinita blogosfera atingiu os seus limites.
O que parecia uma terra de ninguém, já tem regras, regulamentos e xerifes.
Quem faz a demarcação das fronteiras são os provedores das redes sociais, os modernos agrimensores, novos delegados de bons costumes.
Os que se excedem, recebem cartão amarelo e na reincidência, podem ser condenados à morte no desterro.
Com direito a recorrer ao milagre da ressurreição, no paraíso dos perfis falsos.
Quem primeiro deu o alerta foi Umberto Eco (1932-2016) ao receber o título de doutor honoris causa da Universidade de Turim.
Entre tantos maravilhados com as inimagináveis possibilidades da comunicação universal, foi preciso no diagnóstico.
O drama da internet é que ela promoveu o idiota da aldeia a portador da verdade.
Sua crítica ao que representam as novas tecnologias na disseminação da informação, a cada dia vem sendo mais comprovada.
Elitismo intelectual à parte, o pensador italiano observou que a multidão silenciosa passava a ter o mesmo direito à palavra, antes reservada só aos sábios, merecedores de prêmio nobel.
Depois que os tipos móveis de Gutemberg foram trocados pelos editores de textos, os conflitos sobre o que se escreve, diz e mostra, ficaram tão histriônicos que os tribunais tiveram de tomar providências e formar jurisprudência.
E o conceito da liberdade de expressão deixou de ser irrestrito.
As novas regras são claras.
Qualquer um pode externar suas ideias até a fronteira, sem linhas demarcadas, do prejuízo ao outro ou à sociedade.
Nas ágoras helênicas, todo cidadão ou bobo da vila podia expressar seus pensamentos mesmo os não aceitos pelo senso comum.
No mundo virtual, onde fincar as porteiras, eis a questão. E o X.
A pandemia parece ter em seu exército, uma divisão de inteligência que cuida de mostrar a verdade, sem verniz nem filtros.
O tempo e o avanço da doença desmontam narrativas, calam sapiências, desnudam vestais, negam propagandas, dissolvem pés de barro.
A aldeia de McLuhan fala muitas línguas mas só entende a linguagem do perigo.
Quando outro valor mais alto se alevanta, cessa tudo. Até o que a antiga musa cantava.
Quem haveria de pensar que uma dose de meio mililitro da mais preciosa poção já preparada pelo gênio humano, apagasse o fogo das paixões ideológicas.
Excluídos os mentecaptos, a vacina foi aceita por todos.