MOSCOW, TEXAS
O ouro negro, jorrando por tudo que era canto ou quintal, atraiu muita gente para o ainda ínvio oeste.
Daquela vez, os invasores foram recebidos no país, por chuva de pétalas. Rosadas.
O frenesi era percebido em todo lugar. Uma cidade em movimento, na velocidade das carretas de equipamentos pesados, circulando dia e noite.
A boa linfa que o povo saciou, premonição do hino, parecia ser riqueza sem fim.
Muito mais que ocupação para técnicos e trabalhadores na atividade fim, qualquer ideia de um novo investidor, era projetada em sonhos de sucesso e fortuna rápida.
Num tempo em que ainda não havia crescimento vertical, sem nenhum edifício para moradia, as casas conjugadas, em pares gemelares, eram plano e sonho de todo empreendedor. E de cada imigrante. Desde que fosse vinculado à estatal dos hidrocarbonetos ou alguma sua prestadora de serviços.
Em tempos de inflação medida em bigodes de sarney, aluguéis por tempo mais curto, de quatro a seis meses, prazo médio para o turn over do setor em ebulição, só para os modernos cangaceiros do óleo.
O casal de jovens médicos atraído pela oportunidade de trabalho e credenciamento na Previdência (bloqueado na capital), com planos de permanência mais longa, não se enquadrava nos critérios de admissibilidade para novos inquilinos.
A exaustiva busca por um lugar à sombra e uma residência arejada, parecia ter chegado ao fim.
Um colega médico, mais antigo e aquinhoado, viúvo recente, havia acabado de dividir sua mansão assobradada, em dois duplexes.
No lado ocidental, começava a funcionar uma clínica. O outro, disponível para locação.
Preço em conta, abaixo da média.
A última inquilina, médica, demorou pouco. Provavelmente por ter encontrado outra vivenda mais a gosto.
Casa pintada de nova, caixa d’água espaçosa para dias sem abastecimento, quartos para o nascente, elevados, em pé direito alto, ventilação natural, capaz de dispensar o ar-condicionado.
Perto de tudo e dos hospitais.
Mas foi só o contrato ser assinado, para aparecerem os poréns.
No histórico, o rumoroso suicídio da co-proprietária, no amplo banheiro, dividido em dois, na repartição do casarão.
E mais relatos arrepiantes. Do outro mundo.
A doutora não conseguia conviver com o medo nem com tanto jarro quebrado. Toda noite um.
Seu colega, cético, resolveu pagar (aluguel mais barato) pra ver.
Sua descrença sofreu abalo de congelar ossos, quando a secretária do lar relatou o acendimento autônomo do fogão e mais quedas de objetos. Sem ventanias, motivos nem explicações.
A fama de destemido fica credora ao liseu, orçamento apertado e à prática da observação clínica cuidadosa.
Mistérios resolvidos.
Da escada helicoidal de ferro, em balanço, vibrando com a passagem dos treme-caminhões e tudo que a enfeitava, jogado para baixo.
Das bocas do fogão desreguladas, abertas mesmo com os botões na posição desligado.
E o vento aracati a soprar para sudoeste, do bico aceso para os outros supostamente apagados.
Passados 37 anos, os invasores batem em retirada, deixando buracos e fantasmas.
O sertão não virou mar, mas o sal virou petróleo.
(O anúncio de novos e transformadores investimentos na região de Mossoró, trouxe à lembrança, este episódio já relatado há exatos dois anos)