28 de abril de 2024
Memória

A MULHER DO FACÍNORA

O Ladrão (1955) – Oswaldo Goeldi – Pinacoteca do Estado de São Paulo


No século passado, há 65 anos, as profundas mudanças, promessas que começavam a se realizar no rumo dos tão esperados progresso e desenvolvimento, conviviam com um pavor coletivo.

O terror que ameaçava os 160 mil habitantes de Natal, tinha nome e sobrenomes.

João Rodrigues Baracho.

Merecedor de  biografia resumida aos poucos anos vividos na capital, em trabalhos acadêmicos que não localizaram com precisão, origens nem definiram a idade exata.

Mais um jovem vindo do interior, sem parentes importantes  e sem dinheiro no banco.

De bodegueiro no Carrasco, última fronteira do oeste bravio, prolongamento das Quintas Profundas, ao título de mais famoso malfeitor, foi questão de algumas  prisões, fugas mirabolantes e exaltação pela crônica policial.

E o título honorífico de Robin Hood dos pobres miseráveis

Começou com roubos e arrombamentos dos sortidos armazéns do Alecrim para abastecimento da mercearia, passou pelo tráfico da devastadora maconha, até  atingir o clímax com a  morte de três taxistas.

O nome, tão repetido, virou suspeito-primeiro de todo crime de autoria desconhecida.

O latrocínio de um profissional do volante mobilizou a categoria em carreatas e buzinaços, e obrigou o governo a considerar prioridade e questão de honra, sua prisão.

A incrível capacidade de fugir das cadeias, sempre deixando para trás, serras escondidas em pães, transformou-o num Houdini.

Seus desaparecimentos dos palcos dos crimes assombravam também os moradores das cidades do interior.

Deixava  rastro em todo lugar e em qualquer canto, onde tivesse ocorrido um malfeito.

As margens plácidas do Curimataú não ficaram livres da sensação de insegurança e perigo iminente.

O legendário caçador de bandidos, Coronel Bento Medeiros, andou investigando na zona rural de Nova Cruz.

Com o vazamento dos inquéritos sigilosos, não faltaram rumores que estava no encalço do famoso fora-da-lei.

Somente muitos anos depois dos mais de trinta tiros num beco de subúrbio da capital,  e do justiçado ganhar fama de milagreiro, foi revelada a identidade da jovem senhora que passou uma temporada na casa grande,  da beira da linha férrea da Great Western of Brazil Railway.

Não era mais uma albergada para resolver problemas pessoais, tratamento médico ou estudar, em troca de ajuda nos afazeres da cozinha e voto garantido da família nas eleições vindouras.

A testemunha protegida por Dona Joanita, era a mulher de Baracho.

Não fez medo a ninguém.

 

Luz sobre a Praça (1930) – Oswaldo Goeldi – Museu Nacional de Belas Artes, Rio de Janeiro
Figura Fantasmagórica (1927) – Oswaldo Goeldi – Museu Nacional de Belas Artes, Rio de Janeiro

“A minha pobreza é a minha liberdade”        Oswaldo Goeldi (1895-1961)

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(O texto original foi publicado em 16/12/2020)

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