2 de maio de 2024
Coronavírus

IN VINO VIRUS

FB811126-5713-46EA-8AC6-4C199B68827C
        Jesus curando o paralítico no tanque de Betesda       Bartolomé Esteban Murillo (1617 – 1682)                   National Gallery, Londres.


Quando não existe um só remédio, centenas tratam a mesma doença.

Tem sido assim com a da vez e dos milênios.

No mundo todo, enquanto não surgir a vacina salvadora, vai se tentar de tudo.

Não só os moderníssimos modeladores imunológicos emprestados dos tratamentos de doenças crônicas e cânceres.

Medicamentos do arco da velha são lembrados. Alguns deles empolgaram tanto que contam com os melhores garotos-propaganda que se possa imaginar.

Estão nas manchetes de jornais e chamadas dos noticiosos em todas as línguas e sotaques.

Pela primeira vez na história da farmacopeia, uma droga entrou numa guerra política, com verdadeiros exércitos se digladiando nos campos de batalha das redes sociais.

Quando esta página da história for virada, saberemos porque e como  dois ministros da Saúde foram abatidos pelo fogo amigo.

Cientistas, estudiosos e palpiteiros têm todo o direito de defender os seus produtos. Não há tempo de fazer as provas dos noves.

É tomar ou ser largado à sorte.

Do sempre presente chá de boldo ao anti-malárico, passando pelo lombrigueiro, a salvação está em todos os frascos. Até o que foi  usado no campo, no combate aos carrapatos do gado vacum e nos piolhos da criançada.

Pesquisadores do Vale do Curimataú desenvolvem estudos (estão na fase 2) para incluir no arsenal terapêutico, um coquetel de unguentos já em uso contínuo desde que chegou ao mercado farmacêutico em 1885.

Há um século, passou por grande teste, se não de eficácia, de alívio. No combate à gripe espanhola.

Bálsamo, em forma de pomada, contém cânfora, mentol e óleo de eucalipto.

Emplastro tão antigo, deve ter o segredo na proporção dos seus componentes, já que não são conhecidos concorrentes nem formulações similares ou genéricas.

Com indicação de trazer alívio para a tosse dos resfriados quando esfregado no peito das crianças, passou a ser usado também pelos adultos. Daí para chegar às narinas, foi palmo e meio.

Apesar da popularidade inabalável, depois de longos anos fora do receituário dos médicos, voltou à moda e às indicações.

É considerado excelente sedativo para o gôgo  persistente. Agora, com via de administração bem longe do aparelho respiratório. Deve ser espalhado, à noite, nas plantas dos pés, cobertos e aquecidos com meias de lã.

Os mecanismos de ação e interferência na fisiopatologia do novo coronavírus ainda não estão claros, apenas a fé inabalável dos seus usuários,  garante sua prescrição.

Em meados do século passado, Carluce Medeiros, o mais afamado boticário do agreste potiguar, mantinha uma  seleção de medicamentos para atender às urgências dos amigos no veraneio da Barra do Cunhaú.

Uma freguesa, das de caderneta, mandou o faz-tudo buscar o lenitivo que evitaria a noite mal dormida.

Apesar da insistência do portador, Pedro Burranha, a receita oral não pôde ser atendida. Por ilegível.

Dona Joanita mandou buscar Vinho de Arapuruca.

765B44D8-CE67-4937-AF08-483C7123389A

***

A postagem original deste texto é de 21/05/2020, quando a primeira onda de contaminação ainda não havia atingido a crista.

A vacina era só promessa, sem previsão de quando  o milagre seria alcançado.

Muito antes das reclamações dos atrasos nas encomendas dos imunizantes, ninguém imaginava,  que um ano depois, o grupo de risco prioritário (trabalhadores da Saúde e idosos), já estivesse vacinado.

Que o imperador do Japão só recebesse sua primeira dose, dois meses depois dos velhinhos brasileiros.

E que os medicamentos reposicionados, usados off label, sem constar nas bulas e carentes de comprovação científica, ganhassem tamanha  fama, gerassem tanta polêmica e acabassem no picadeiro de uma CPI.

52E68A4D-6797-4007-BF78-9BE40F52714A

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *