MAU HUMOR TAMANHO FAMÍLIA
Nas reminiscências familiares, tratando-se de humor, o mau sempre vence.
Os mal-humorados são lembrados com mais carinho e saudade.
Tio-avô e afim, já havia sido apresentado muito antes do primeiro contato imediato e presencial, nas estórias que cada contador aumentava um ponto.
A carranca, justificava a fama, e a pouca conversa podia até ser estendida, mas as respostas continuavam rápidas e ríspidas.
De família tradicional espalhada a partir de Caruaru, construiu moradia e vida no sertão paraibano, limites com o Ceará.
Dono de algumas terras, vivia do que ela e o gado davam.
Tentou a política mas não conseguiu se eleger, nem para a bancada dos sem carisma.
A rara visita de um sobrinho que só queria trazer e levar notícias da parentada distante, não foi capaz de amenizar seu baixo-astral, crônico e estrutural.
O parlatório mal começou e já deu pra notar que pr’aquelas bandas as coisas não iam muito bem.
Carestia grande.
Com pouco movimento no comércio e nas feiras, o dinheiro não circulava.
Seca prolongada.
Gado magro, definhando, com quase nenhuma produção de leite.
O governo nada fazia, a não ser, arrochar na cobrança dos impostos.
Saúde precária.
Piorada por mijadeira que o doutor disse ser problema de próstata.
Família desunida. Cada um levava a vida, ilhado no imenso arquipélago do afeto.
Há muito não tinha nem notícia dos filhos, nem deles queria saber.
Para amenizar a conversa, resolveu perguntar pela tia ausente:
Foi pra Fortaleza, se amigar com o Papa.
Em 1980, o Santo Padre João Paulo II fazia sua primeira visita ao Brasil.
(Texto publicado em 20/04/2019)
Só posso afirmar que o “aprendiz” está dando aula de redação. Parabéns.