28 de abril de 2024
Coronavírus

MIREM-SE NO EXEMPLO

 

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Mulher doente (1633) – Jan Steen – Rijksmuseum, Amsterdam, Holanda


Os registros  de uma saga pela sobrevivência, publicados como um imenso alívio, torna-se um ano depois, uma parte da história da pandemia.

Desventuras transformadas em vontade de viver.

Exemplo de fé, como tantos, em tantas famílias.

RECEITA DE SOGRA

Com nove filhas, outro tanto de genros, netos e bisnetos (que só aumentam), prepara banquetes do dia-a-dia para um batalhão.

Em família que guarda e passa às novas gerações, tradições culinárias, é referência de quituteira.

Receitas, perdeu a conta de quantas espalhou.

Aos 91 anos, viúva,  presidente de uma associação de pais e amigos de pessoas com deficiências, vinha respeitando o isolamento social, liderando seu aguerrido time, à distância.

Como tantos outros que por correrem maiores riscos, cuidavam com mais rigor do distanciamento social, conheceu o inimigo, trazido para seu refúgio, por pessoa muito próxima. E querida.

Decidiu enfrentar a maior ameaça à sua saúde, em campo de batalha que escolheu por conhecer bem.

Transformou a casa em uma unidade hospitalar.

Quando uma das médicas assistentes sugeriu uma curta temporada em hospital de verdade, negociou a intensificação dos cuidados domésticos.

Às filhas, foi mais contundente.

Aceitaria qualquer tratamento, com a única exigência de não ter que sair de casa. Lugar que já lhe  havia servido de maternidade, tantas vezes.

E para que não restassem dúvidas, declarou-se em pleno controle das faculdades mentais.

Lembrou que para ter seu direito assegurado, se preciso fosse, invocaria os ensinamentos da velha Faculdade do Recife, onde, em  1953,  foi das poucas mulheres a concluir o curso.

O livre-arbítrio prevaleceu.

Seguiu com disciplina exemplar, as recomendações da ciência e das artes médicas.

Quando já se preparava para o retorno à rotina fora das injeções, decúbitos, horários, termômetro, comprimidos  e xaropes, a constatação do comprometimento pulmonar em mais de 50%.

A luta que não havia acabado, recrudesceu. Mais violenta e perigosa.

Então , com armas comprimidas em cilindros de oxigênio, protegida por máscaras de astronauta e mobilização limitada ao permitido pela fisioterapia e pelo oxímetro.

A certeza que completaria a dolorosa travessia, contou em orações e assegurou com a fé que nunca faltou.

Entre avanços e recuos, manteve o moral da tropa elevado e para a imensa torcida, nunca deixou de dar esperanças que o jogo terminaria em vitória.

Na calmaria que segue tantas incertezas, no seu riquíssimo livro da vida, mais uma receita (e lição) anotada.

Esta doença é terrível.

Não bastam os medicamentos e os cuidados médicos.

A gente tem que ir buscar lá dentro, não se sabe bem onde, forças para continuar com vontade de viver.

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A Dra. Margarida da Mota Rocha venceu a Covid

One thought on “MIREM-SE NO EXEMPLO

  • Margarida Araújo Seabra de Moura

    Tudo o que você escreve, meu amigo-irmão, é sobremaneira elegante e irretocável!
    Mas esse texto sobre sua sogra, minha amiga, xará é meu ídolo é por demais pertinente! Ela é única no mundo!!!

    Resposta

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