3 de maio de 2024
Tecnologia

O NACO DA MAÇÃ

Adão e Eva no Jardim do Éden (1550) – Tiziano Vecellio, Museu do Prado, Madri


A maior empresa de tecnologia do mundo envia aos seus usufrutuários, relatórios da participação nos negócios.

O somatório do tempo de uso de cada um, grandeza medida em bytes, é a cova rasa que nos cabe naquele latifúndio.

Entre muitas informações,  destaque que nos últimos sete dias, a cada 24 horas, seu produto de maior sucesso ficou nas mãos do destinatário, menos de duas horas.

Devem ter achado muito pouco.

Por isso a preocupação e o sub-reptício estímulo ao consumo, sem esquecer que provectos também tornam-se adictos em tecnologia, e que smartphones viciam.

Acompanha o demonstrativo, um alerta para o fraco desempenho e o puxão-de-orelha,  que o cliente já foi mais participativo.

Em gráfico de powerpoint, tão convincente que parece feito por procurador de lava-jato, a vergonhosa  redução de humilhantes 74% na média histórica.

O detalhamento mostra que as redes sociais consumiram quase metade do tempo.

Não chega ao ponto de precisar quantas mensagens de agradecimento pelos votos recebidos de saúde, paz e felicidade no Ano Novo, foram postadas e se padronizadas, tomaram ou não menos tempo.

De leitura (que ao menos, tenha sido de coisas edificantes e de futuro), somente míseros  12 minutinhos.

A rolagem das telas e o vôo de águia sobre as manchetes dos jornais e blogs bem que explicam o fraco desempenho e o fiasco  na fidelidade do ciberleitor.

A informação que toda a produtividade aferida foi realizada em 14 minutos, além  de provocar uma súbita coceira retroauricular, deu margem para contestação.

É bem verdade que o período analisado incluiu dias à beira mar, o que pode explicar mudanças nos hábitos de qualquer um.

O inexplicável é que a produção dos textículos,  a razão de um por dia, continuou sem interrupções .

Como são produzidos ou reprocessados a dedo indicador na telinha brilhante, das duas, uma.

Ou a escrita,  tão  rápida,  atingiu o estágio de prestidigitação ou trata-se de lamentável mas aceitável equívoco de quem tem trabalho a fazer, enquanto todo mundo ainda curte a ressaca das festas de fim de ano.

Dá pra desconfiar na embriaguez provocada  pelo  naco da maçã, arrancado à dentada, e utilizado pelos viventes no vale do silício, para produzir sidra, bebida das  mais  consumidas nesta época do ano.

Não custa lembrar que no Jardim do Éden, os infratores que deram as primeiras mordidelas na fruta proibida, ouviram a maldição repassada  para a descendência e herdada por toda a humanidade, até estes nossos tempos digitais.

.“com dor, comerás dela todos os dias da tua vida.”

La Gloria (1554) – Tiziano Vacellio, Museu do Prado, Madri

(Este tema foi tratado neste TL, em 08/01/2022)

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