RIO GRANDE EM DOIS TEMPOS
A torcida do Brasil de Pelotas já sabia o segredo revelado pelo jovem governador a um surpreso Pedro Bial.
Pelo espanto, só o entrevistador não estava esperando uma conversa tão explosiva.
Da intimidade de um papo de fim de noite para as mídias sociais, as inevitáveis e infames piadinhas também deram picos de audiência, encaminhamentos e likes.
E uma enxurrada de mensagens de apoio e reconhecimento pela coragem de quem se apresenta como pré-candidato à presidência da república, demonstra, estava mesmo na hora de quebrar o tabu.
Em tempo de urnas eletrônicas, auditáveis ou não, armário não é mais lugar pra se guardar votos. Nem segredos.
Ó Tempora, Ó Mores.
No outro rio grande, uma cidadezinha com dez vezes menos habitantes, também carrega o famigerado preconceito e semelhante motivo para chistes e chacotas.
Uma estória ocorrida há mais de 70 anos, reminiscências passadas aos que vão, contra a vontade, envelhecendo, é repetida agora para mostrar como a temática já foi tratada.
O NOVIÇO ALEGRE
Nos tempos de Vargas, delegados de polícia eram escolhidos pelos mesmos critérios que Aspones continuam sendo hoje em dia.
Pelo QI.
Assim, um comerciante com fama de correto nos negócios, conduta ilibada e durão, tornou-se o novo responsável pela segurança da progressista cidade.
Tal um talibã, escolheu como prioridade, fazer um jirad contra homossexuais.
Dizia que a cidade já estava por demais mal afamada alhures pela sua mocidade alegre.
A estratégia era prender e dar um corretivo nos mais exibidos e extravagantes.
Certo que só obteria sucesso também com ações preventivas, passou a apreender os jovens que exibissem trejeitos afeminados, por mais dissimulados que fossem.
Cortar o mal pela raiz, seu lema.
O tratamento precursor da cura gay incluía longa preleção, corte de cabelos à máquina zero e devolução pública e ruidosa dos futuros homoafetivos, aos pais.
Um dos punidos, alegre por genética e natureza, mostrou-se mais animado ainda enquanto tinha as madeixas tosadas.
Debochado, encarou a autoridade repressora:
-Não vejo a hora de ver o senhor raspando a cabeça do seu próprio filho.
No dia seguinte, na capital, o seminário ganhou um noviço.
(Publicação original em 04/04/2019)
Retrato de Fra Angelico (1501) Luca Signorelli – Detalhe do afresco “Atos do Anticristo”, Catedral de Orvietto.
