3 de maio de 2024
Opinião

Sem o motor, Lava Jato não chega ao Judiciário

Cassiano Arruda Câmara-190521

Pela primeira vez na sua história, o Supremo Tribunal Federal teve de se pronunciar se um dos seus integrantes pode, ou não, ser investigado pela Polícia Federal, por suspeita de corrupção.

Indícios análogos, aos sustentados pela delação do ex-governador Sérgio Cabral, do Rio de Janeiro (condenado a mais e 300 anos de prisão), já haviam sido apresentadas em diferentes oportunidades.

O suficiente para destruir reputações, sobretudo de integrantes da classe política brasileira que tiveram suas vidas devassada e a reputação destruída por um espetáculo que começava com uma ação espetaculosa da polícia, e massiva cobertura da imprensa, começando nas primeiras horas da manhã com um show de televisão transmitido ao vivo da casa do denunciado, muitas vezes com a sua prisão, esquecendo-se completamente os direitos e garantias individuais assegurados pela nossa Constituição Cidadã.

O ex-governador Cabral disse numa delação premiada que um dos seus operadores pagou R$ 4 milhões ao ministro Dias Toffoli para que favorecesse a dois prefeitos, em processos no Tribunal Superior Eleitoral.

O ministro Edson Fachim mandou arquivar o pedido de investigação ao seu colega feito pela Polícia Federal, na última sexta-feira, e proibiu a PF de fazer qualquer apuração com base na delação de Cabral.

GUERRA DE SETE ANOS

A operação Lava Jato, antes de ter sido batizada, teve início em 17 de março de 2014, e conta com 80 fases operacionais autorizadas, entre outros, pelo então juiz Sergio Moro, durante as quais prenderam-se e condenaram-se mais de cem pessoas.

Nesses sete anos, investigou crimes de corrupção ativa e passiva, gestão fraudulenta, lavagem de dinheiro, organização criminosa, obstrução da justiça, operação fraudulenta de câmbio e recebimento de vantagem indevida.

A Lava Jato foi apontada por críticos como uma das causas da crise político-econômica de 2014 no país. De acordo com investigações e delações premiadas, estavam envolvidos em corrupção, dirigentes da Petrobras, políticos dos maiores partidos do Brasil, incluindo presidentes da República, presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado Federal e governadores de estados, além de empresários de grandes empresas brasileiras.

A Polícia Federal considera a LJ como sendo a maior investigação de corrupção da história do país.

INVESTIGAÇÃO SEM MOTOR

A Delação Premiada foi considerada, “o motor” da Lava Jato, desde a ligação de Paulo Roberto Costa, Diretor da Petrobrás, com o doleiro Alberto Yussef.

No ano seguinte, caiu Nestor Cerveró, outro Diretor da Petrobrás. Em junho de 2015 chegou às grandes empreiteiras (Odebrecht, OAS, Andrade Gutierrez e tantas outras). Normalmente começando com prisões no estilo Lava Jato, com direito de transmissão ao vivo na TV e ampla cobertura por todos os meios de comunicação.

A Integração Lava Jato-Imprensa era tão forte, que as pautas dos meios de comunicação ganharam outro dia nobre: a terça-feira. Que começava logo cedo com a prisão (ou condução coercitiva ou, no mínimo, busca e apreensão) de algum figurão.

Entre os punidos pela Lava Jato figuram o ex-governador do Rio de Janeiro Sérgio Cabral e o seu sucessor Luiz Fernando Pezão; ainda durante o mandato, o ex-senador Delcídio do Amaral, o ex-presidente da Câmara dos Deputados Eduardo Cunha, os ex-ministros da Fazenda Antonio Palocci e Guido Mantega, o publicitário João Santana, o ex-ministro-chefe da Casa Civil José Dirceu, o empresário Eike Batista e, em abril de 2018, o ex-presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva, além de empresários do calibre de Otávio Azevedo e Marcelo Odebrecht.

ESCALA MUNDIAL

Ao final de 2016, a Operação Lava Jato obteve um acordo de leniência com a empreiteira Odebrecht, que proporcionou o maior ressarcimento da história mundial.

O acordo previu o depoimento de 78 executivos da empreiteira, gerando 83 inquéritos no STF, de quem o ministro Edson Fachin retirou o sigilo em abril de 2017. Novas investigações surgiram no exterior a partir destes depoimentos em dezenas de países, dentre eles Cuba, Peru, Angola, El Salvador, Equador e Panamá.

Em 2017, peritos da Polícia Federal informaram que as operações financeiras investigadas na Operação Lava Jato somaram oito trilhões de reais.

Depois, iniciou-se a carreira cinematográfica do Lava Jato, com meia dúzia de filmes relatando suas histórias, alguns no mercado internacional.

Como não dá pra fazer mais um bom filme com mocinhos e bandidos. Apareceu o “VazaJato”, com o blog The Intercept, comandado pelo jornalista americano Gleen Greenwald divulgando conversas privadas que reduziram a pó as asas dos anjos dessa história; de Moro a Dallangnol.

O FIM DA HISTÓRIA

Aparentemente chegamos ao “grand finale” da Operação Lava Jato, “maior ação integrada em nome do combate a corrupção em todo o mundo”, a partir do Vasa Jato e, agora, consolidado com o bloqueio das investigações entre os integrantes do Supremo Tribunal Federal.

Tanto quanto a proibição de investigação a um membro da mais alta Corte, o fim já havia sido antecipado logo pelo novo “modus operandi” adotado; neste último caso, já não era como as operações que popularizaram a Lava Jato, com direito a espetáculo policial, e desrespeito aos direitos dos denunciados, que nivelava os poderosos do Brasil aos frequentadores das barras dos tribunais comuns, com aplausos da populaça.

Em compensação, se algum culpado não se aproveitar dos limites para as investigações, que fique a esperança de que, para cumprir a lei não há necessidade de desrespeita-la, como ocorreu nos primeiros anos da LJ, quando adotou-se a mesma jurisprudência que é praticada pelas milicias.

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