28 de abril de 2024
Coronavírus

FILHOS DE SOFIA

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Retirantes – Cândido Portinari (1904-1962)


Com muito periquito pra duas gamelas só, não tem jeito. A farinha é pouca e meu pirão,  primeiro.

Não poderia ser diferente se as poções vêm de tão longe e chegam medidas a conta-gotas, trazendo em seus mililitros, todas as esperanças do fim do flagelo que só aumenta.

A difícil operação  de salvamento logo empacou quando se percebeu que o lençol era curto.

Quando cobria a cabeça dos europeus, descobria os pés norte-americanos.

Quem não cuidou de garantir agasalho, desdenhou do fabricante, pensou que era hora de escolher grife e que haveria fila de vendedores na porta do palácio, agora conta os trocados, guarda as migalhas e distribui sobras.

Com menos de dois por cento da população atendida,  a vacinação no Brasil virou caso de ministério público.

As prioridades têm exigido um novo ramo do poder judiciário.

O Direito Imunológico.

Os que decidem quem vai ocupar  os primeiros lugares na fila e condenam os tentados a furá-la, ainda não encontraram na prática, a fórmula da espera paciente e pacífica.

O risco do pau fez o machado mirar nos grupos de maior risco.

Profissionais da saúde e idosos.

Como diria o filósofo do Brejuí, ‘tudo é relativo, dentro da relatividade das coisas’.

Descobriu-se que há médicos e médicos; enfermeiros e enfermeiros; técnicos e técnicos; velhos e velhos.

Setentões, esqueçam o estatuto do idoso. Curtam a juventude estendida por decreto municipal e tomem seus lugares somente depois que a nonagésima quinta velinha for soprada.

Pessoal da bata branca, não lembre da recomendação, há oito meses, para os mais experientes deixarem a perigosa linha de tiro e se posicionarem  na retaguarda.

Conselhos, deixem para a administradora do postinho, a prerrogativa de atestar quem está apto ao exercício da profissão.

Comuno-burocratas, considerem abominável que grandes empresas patrocinem a imunização dos seus empregados.

Mesmo que a inusitada benevolência repasse para o governo, o mesmo número de doses que vierem a usar.

Cientistas de birô, especialistas em leitura dinâmica de quilométricos relatórios, continuem exigindo demorados testes em vacinas com milhões de provas de eficácia e  segurança.

Altíssimos dirigentes, sigam tomando suas decisões com um olho na reeleição e dois, no termômetro que mede os índices positivos dos institutos de pesquisa.

Atordoados, os desgarrados filhos da tragédia, sem rumo, seguem a multidão, sem líderes, esperando que um dia, sejam acolhidos e refugiados em lugar seguro.

E protegidos.

Até que venha a próxima onda.

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Guernica – Pablo Picasso (1881-1973)

 

One thought on “FILHOS DE SOFIA

  • Geraldo Batista de Araújo

    Tomel a primeira dose da vacina
    no dia primeiro deste mês que já foi de carnaval, na cota da diretoria da Liganorteriograndense contra o Câncer.

    Resposta

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