4 de maio de 2024
Imprensa Nacional

Pastores liberam dinheiro no MEC em prazo recorde de até 16 dias, enquanto outros esperam mais de 10 anos

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Do Estadão 

O gabinete paralelo formado por pastores no Ministério da Educação tem obtido uma taxa de agilidade na liberação de verbas da pasta para municípios fora dos padrões de repasses federais.

Desde o começo do ano passado, os religiosos Gilmar Santos e Arilton Moura, que, como revelou o Estadão, controlam a agenda do ministro Milton Ribeiro, intermediaram encontros de prefeitos no MEC que resultaram em pagamentos e empenhos (reserva de valores) de R$ 9,7 milhões dias ou semanas após promoverem as agendas.

Em um dos casos, uma prefeitura conseguiu o empenho de parte do dinheiro pleiteado apenas 16 dias depois do encontro mediado pelos religiosos.

Só em dezembro foram firmados termos de compromisso, uma etapa anterior ao contrato, entre o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) e nove prefeituras, de R$ 105 milhões após reuniões com os pastores.

Especialista em finanças públicas, Eduardo Stranz afirmou que é “difícil” um prefeito conseguir liberar recursos em apenas 16 dias:

“Isso é muito difícil.

Temos coisas que não são pagas desde 2010, para você ter uma ideia.

Conseguir essa liberação tão rápido… tem que ter muita vontade de todo mundo para sentar e conseguir essa liberação do dinheiro”, disse ele, que é consultor da Confederação Nacional de Municípios (CNM).

“Isso tudo envolve muita burocracia, muito papel, muita negativa.”

Ao menos 48 municípios foram contemplados após encontros com pastores entre os primeiros meses de 2021 até agora, sendo 26 deles com recursos próprios do FNDE – o restante recebeu dinheiro de emendas do orçamento secreto.

A prefeita Marlene Miranda, de Bom Lugar (MA), teve o pedido de dinheiro atendido em apenas 16 dias, prazo fora dos padrões da distribuição de recursos federais.

Em 16 de fevereiro, ela esteve no MEC acompanhada do marido, o ex-prefeito Marcos Miranda, numa agenda intermediada pelos religiosos Gilmar Santos e Arilton Moura.

No último dia 4, o FNDE reservou R$ 200 mil para pagamento à prefeitura. O recurso foi destinado para a construção de uma escola de educação infantil, obra estimada pelo município em R$ 5 milhões. Procurada, a prefeita não quis comentar.

Gilmar e Arilton se apresentam como presidente e assessor da Convenção Nacional de Igrejas e Ministros das Assembleias de Deus no Brasil, respectivamente. OEstadão revelou que eles participaram de 22 agendas oficiais do MEC, sendo 19 delas com a presença do ministro, do ano passado para cá.

Procurados, os religiosos admitiram que levam prefeitos ao gabinete de Milton Ribeiro, mas não explicaram por que participam de reuniões onde são discutidas liberações de recursos.

Disseram que não pedem contrapartida pelo acesso ao ministro e que fazem isso porque são “homens de Deus”. “Nunca houve (contrapartida)”, disse Gilmar. Arilton alegou que nunca participou de reunião sobre obras, embora conste de agenda do MEC. O ministério não comentou.

ENTENDA COMO FUNCIONA A ATUAÇÃO

Reunião: Na manhã do dia 16 de fevereiro, uma quarta-feira, a prefeita de Bom Lugar, no Maranhão, Marlene Miranda (PCdoB), esteve em Brasília para uma reunião com o ministro da Educação, Milton Ribeiro. O encontro foi intermediado pelos pastores Gilmar Santos e Arilton Moura.

Demandas: De acordo com o site da prefeitura de Bom Lugar, Marlene Miranda entregou a Milton Ribeiro uma pauta de demandas, como a “construção de novas escolas e novos ônibus escolares”.

Liberação: Apenas 16 dias depois da reunião entre prefeita e ministro, o sistema de pagamentos do governo federal, o Siafi, registrou um empenho de R$ 200 mil para a prefeitura de Bom Lugar. O empenho é uma reserva que o governo federal faz para quitar depois. Segundo a nota de empenho, o dinheiro se destinava ao “apoio à implantação de escolas para educação infantil”.

Recursos: Desde o começo do ano passado, pelo menos 48 prefeitos que participaram de reuniões intermediadas pelos pastores conseguiram a liberação de recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE). Entre empenhos e pagamento de débitos antigos, foram R$ 9,7 milhões.

‘Termo de compromisso’: O dinheiro empenhado representa uma pequena parte do valor prometido pelo FNDE aos municípios por meio dos chamados “termos de compromisso”. Em pelo menos nove das 48 cidades, estes “termos” somaram R$ 105 milhões.

Pagamentos: Em Bom Lugar, foram três “termos de compromisso” com o FNDE que somaram quase R$ 20 milhões. Os termos foram assinados entre 22 e 31 de dezembro de 2021. A cidade já tinha recebido outros pagamentos no ano passado, antes mesmo da assinatura dos termos.

DO TL 

Mais um dado trazido à tona nesta terça-feira, 22, : “Foi um pedido especial que o presidente da República fez para mim sobre a questão do [pastor] Gilmar”, disse o ministro da Educação em audio.

Para muitos especialistas de Direito, existe grande possibilidade de configuração de crime de responsabilidade e tráfico de influência, vez que o simples de fato de afinidade político-ideológica dos pastores com o presidente Bolsonaro poderia justificar o “fura-fila” já comprovado pelas matérias jornalísticas.

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