1 de maio de 2024
Imprensa Nacional

PEC das Drogas é vingança contra STF, mas não resolveu omissões da lei

Emoldurar a PEC das Drogas como uma vingança contra o Supremo é um favor e tanto para o Senado.

A proposta que enquadra como crime a posse e o porte de entorpecentes em qualquer quantidade é uma daquelas inovações que desfilam com o surrado disfarce da defesa institucional, apenas para despejar seus resíduos no mundo real.

A ideia nasceu pelo motivo errado.

O Senado armou a reação quando o STF caminhava para determinar que o porte de maconha não deve ser considerado crime. O tribunal ensaiou um passo largo demais com a descriminalização.

Acertou onde pisava, porém, ao restringir a discussão à maconha e propor uma quantidade de droga para diferenciar usuário de traficante.

Os senadores não estavam interessados em aprimorar as regras.

Pela lei atual, o porte de maconha é crime, mas usuários não estão sujeitos a prisão.

Rodrigo Pacheco sugeriu manter a criminalização, mas não indicou nenhum critério para diferenciar o porte do tráfico.

Seus colegas ainda conseguiram piorar o texto.

A proposta aprovada na terça-feira (16) estabelece que a distinção entre traficante e usuário deve ser feita “pelas circunstâncias fáticas do caso concreto”.

QUEM VAI SER PRESO PELAS CIRCUNSTÂNCIAS FÁTICAS? 

No dia a dia, a decisão seria tomada por policiais, delegados e juízes. Dada a afeição geral pelo populismo penal, pode-se dizer que o encarceramento em massa ganharia mais um atalho.

Pacheco defendeu a proposta com o argumento de que “o usuário não será jamais penalizado com o encarceramento”.

Alguém poderia lembrar ao presidente do Senado que as “circunstâncias fáticas do caso concreto” costumam ser aplicadas de maneira bem diferente para ricos e pobres, brancos e negros.

O Senado anda irritado com aquilo que enxerga como tirania do Supremo, mas topou dar uma forcinha ao arbítrio nas esquinas, terceirizando a interpretação da Constituição.

Furiosos com um tribunal que invade as competências do Poder Legislativo, os parlamentares abriram mão, na prática, de legislar.

Por Bruno Boghossian na Folha 

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