28 de abril de 2024
ComunicaçãoHistória

RÉQUIEM AETERNAM

O Telefone (1961) – Andy Warhol – MOCA, Museu de Arte Contemporânea, Los Angeles, EUA


Mesmo com todo o merecimento pelos inestimáveis serviços prestados, o repouso lhe tem sido negado.

Mais fora de moda que obsoleto, o telefone fixo agoniza, sem direito a um gesto de compaixão.

Relegado a um canto qualquer, esquecido e inútil, não tem direito nem de ser considerado raridade.

Ao ser apresentado a um aparelho com disco, e solicitado a fazer uma ligação, um adolescente com cara de nerd, depois de várias tentativas, desistiu.

Alegou que as teclas apresentavam  defeitos.

Usuário de uma operadora de telefonia, querendo reduzir as tarifas e diminuir as ligações do telemarketing, pediu o cancelamento da linha fixa.

Foi informado que já não havia qualquer cobrança pelo seu uso.

Mesmo insistindo que desejava cancelar o serviço, foi apresentada a única maneira de fazê-lo:

É só retirar  o aparelho da tomada.

Está com os dias contados a sobrevivência de um dos maiores inventos.

E não é porque deixou de ser útil.

Continua tão necessário quanto em 1860,  quando o inventor florentino Antônio Meucci, refugiado politico em Nova Iorque, criou um meio de comunicação entre sua oficina, no térreo e o quarto da mulher, com reumatismo, no primeiro andar.

O italiano não foi muito feliz na escolha do nome da engenhoca.               

Teletrofone não pegou.

Sem patente, recebeu como prêmio de consolação,  a glória de ter bolado o precursor do telefone.

Mas somente 113 anos depois de sua morte, em 2002 , quando o congresso americano reconheceu seu pioneirismo.

Quem levou os louros,  a fama e a grana foi o yankee Graham Bell.

No Brasil, chegou com o entusiasmo de Pedro II, depois de ter assistido uma demonstração na exposição de Filadélfia em 1877.

Começou ligando repartições públicas,  lojas maçônicas e o quartel do corpo de bombeiros.

Sua expansão deveu-se  à iniciativa privada e à Telephone Company of Brazil.

O que era bom para os Estados Unidos podia também ser bom para o Brasil.

Sobreviveu ao furor perdulário estatal até ser vencido pelas crises econômicas, as novas tecnologias e pela privataria tucana.

Calcula-se que não completará o sesquicentenário em terra brasilis. Ou alguém ainda imagina mais cinco anos de sobrevivência?

Seu aperfeiçoamento e verdugo, o telemóvel, não só ganhou enorme popularidade, como demonstra a cada dia que os fixos são aparelhos em extinção.                    

Nas residências, já relíquias.

Para peças de museu, um pulo.        

Prevê-se um melancólico final,  com uso restrito ao serviço público.                                                              Tal e qual no tempo do Segundo Império.

Foram necessários mais de 40 anos para que os celulares, criados em 1947 nos laboratórios da empresa  fundado por Bell, chegassem ao público. Mais uma vez a necessidade fez a ocasião.

Com tantas quedas de postes nos rigorosos invernos, os finlandeses resolveram radicalizar.

Aboliram os fios e bolaram a Nokia.

Depois a história que todos sabem.

Os asiáticos os fizeram menores e os americanos disseram como os coreanos e chineses deveriam fazer menores ainda.

E o que incorporar aos novos modelos.

E da luz, fez-se o iPhone.

Não consta nem nas previsões de Júlio Verne.                                      

O máximo que imaginou foram os noticiários na TV e as vídeoconferências.

Hanna-Barbera, com os Jetsons, foram mais longe.

Anteviram os videofones.                             

Mas só nos carros voadores e nas telonas das casas do futuro.

Cheios de antenas de todos os tamanhos e  formas.

Ficaram fora dos devaneios dos futurólogos.

Ninguém ousou pensar nisso que está neste momento na sua mão.

E do que ele é capaz.

Halloween (1949) – Andy Warhol – Museu Andy Warhol, Pittsburgh, Pensilvânia, EUA

 

(O texto publicado em 17/09/2019, sofreu modificações. O telefone fixo do autor estaria guardado numa caixa de sapatos, se estas também ainda existissem)

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