TRABALHO FACULTADO
O distanciamento social fez-se necessário e as pessoas e negócios logo se adaptaram. A produtividade foi mantida ou aumentada. Os custos desabaram.
Mais da metade dos funcionários-colaboradores que passaram a trabalhar à distância, deverão permanecer neste regime por opção das empresas.
No mundo do serviço público, a metereologia é diferente. Sob trovoadas, ou todos em casa, ou todos nos seus birôs.
Foi só a folhinha marcar as datas do Carnaval, mesmo que este ano ninguém estivesse com alegria acumulada para explodir em festa e folia, para a engrenagem burocrática entrar em ação. Na sua lógica peculiar, sem atravessar o ritmo de sempre.
Alguém lembrou que o ócio é o pai de todos os vícios. E que uma mente desocupada não cultiva virtude alguma.
Assim, foram revogados os pontos facultativos que datam dos tempos da oligarquia Maranhão.
Pouco importa se alguns dias a mais de recolhimento podem ajudar na contenção da contaminação, a ordem é aglomerar todos, nos seus locais de trabalho.
Mesmo que as classes mais produtoras já tivessem decidido que naqueles dias não haveria negócios.
Quem é macaca velha nestes assuntos de produtividade estatal sabe que a mudança no curso das águas por onde navegam, lentamente, as imensas balsas carregando pilhas de processos, empenhos, despachos, memorandos e solicitações urgentes, só serve para retardar ainda mais a penosa viagem.
Que em dias de comparecimento opcional, ninguém aparece para remar sozinho.
Os motores serão desligados.
Os elevadores permanecerão parados, com a manutenção terceirizada, de folga.
Todos os sistemas cairão. E o estagiário nerd que resolve os pepinos, estará também ausente.
A moça do cafezinho virá com suas desculpas depois que tomar as cinzas que recuperam forças.
Quantos não terão apresentado sintomas iniciais e por precaução mais do que adequada, não evitaram que o mal se propagasse mais ainda?
Conta o anedotário do serviço público estadual que um alto dirigente, no exercício do mais elevado posto de função comissionada, tendo publicado portaria disciplinando o não funcionamento da repartição nos dias de farra, indagou se era costume a volta à normalidade no segundo período da quarta-feira de cinzas.
A segurança da resposta fez o chefe que queria dar o bom exemplo, antecipar a volta do lazer praiano.
Na hora H, no expediente D, o paletó deixou o espaldar da Giroflex mas a Bic não saiu do bolso.
O tempo passou junto com uma espera razoável e das almas, das vivas, nenhuma apareceu. Nem para a resenha dos dias de entrudo ou descanso.
Este ano, o mais diferente de todos, a Quaresma começou mais cedo.