26 de abril de 2024
Carnaval

RESENHA DA TRAGÉDIA QUE NÃO ACONTECEU

 

8F6CB660-B531-4430-BCBB-D114BDF93EE6
Carnaval na Rua (1952) – Di Cavalcanti


Depois de cumprir suspensão compulsória, o
Carnatal saudou as autoridades sanitárias, pediu passagem, e passou incólume pelas estatísticas macabras.

Se bem que não se saiba o motivo de tanta alegria, só o fato de ter resistido ao mau presságio, já foi o suficiente para manter a energia que se renova em sons de guitarras e tambores.

Mas este ano não foi igual aos 30 que passaram.

A cidade já não se incomoda com armações nem desmontes das estruturas metálicas.

O trânsito não se altera, além do que permitem os preços dos combustíveis.

Hotéis, se não registraram overbooking, ganharam ânimo na esperança que o turismo interno haverá de fazer outras estações nas alturas.

Os restaurantes, que já acompanhavam o ritmo novo normal, puderam botar mais água no feijão.

A exigência do passaporte da vacina fez esquecer os temíveis outros perigos em volta dos corredores da folia.

Se houve distribuição de camisinhas, ninguém ficou sabendo por anúncios de TV.

O bloco dos jornalistas politicamente corretos foi empastelado.

Os poucos políticos que apareceram, receberam mais censura nas redes sociais que citações do alto dos palcos em movimento.

A anunciada sombra de thanatus não encobriu vênus.

Eros continuou lançando  suas flechas a céus, refletores e holofotes abertos.

Casais de todas as formas de amar, voltaram a se encontrar, longe dos sites de relacionamento.

A rotina da cidade não sofreu mudanças.

Ninguém precisou sair para garantir tranquilidade. E silêncio.

Foi dispensado o  ponto facultativo na sexta-feira gorda de axé.

Em home office não se precisou de autorizaçaão do chefe para queimar o expediente, na ressaca da segunda.

As contas do fim de ano voltam a ser pagas com a  renda extra das barraquinhas armadas nas calçadas e o peso gelado das caixas de isopor nas cabeças de quem tem sobrevivido de auxílios emergenciais.

Do entrudo, ficou saudade. E lembranças dos amores cantados em versos de poetas baianos.

Se antigos foliões choram o tempo  das fantasias de pierrôs, colombinas, arlequins, piratas da perna-de-pau (e do rum montilla), as lágrimas agora rolam pelos abadás, mamãe-sacodes e cheirinhos da loló.

O lockdown seletivo e voluntário passou pelo seu mais rigoroso teste.

Depois de quase dois anos de medo, a folia foi a primeira grande reação coletiva contra a doença mais assustadora.

Garantido pelos comitês científicos, o direito de ir, vir e se esbaldar, só não foi atrás do trio elétrico quem, vacinado, não quis.

Ou morreu na pandemia.

69F51312-1918-4BAE-84BC-74704CB4B6EF
Um Sonho de Carnaval (1955)
C7FBF47E-83C6-4D33-BEFF-FC5F59EDCB7E
Carnaval (1968)
DEF7275A-B1DA-4A33-A645-6605E50D6325
Carnaval no Morro (1965)
BD428D7B-DCA0-4361-80DD-DC38079298D3
Carnaval (1960)

                      Di Cavalcanti (1897-1976)

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *