30 de abril de 2024
Comportamento

À SOMBRA DAS CHUTEIRAS PENDURADAS

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Bernard Safran 


De tão forte e representativa, a expressão saiu das quatro linhas do gramado e do esporte,  para significar toda interrupção definitiva de atividade profissional.

A origem do termo no universo do futebol é desconhecida,  mas acredita-se, por tratar de profissão de curta duração e sujeita ainda a abreviação abrupta, por conta de infortúnio ou contusão.

A desistência voluntária ou não, do trabalho formal, por mais planejada, é sempre acompanhada de incertezas.

Saber a hora de parar é dilema que para ser decidido, conta com outra analogia vinda dos grandes estádios e campos de várzeas.

Sair no auge da carreira ou depois de uma grande conquista, é o que se recomenda, apesar dos raros exemplos práticos.

Na língua portuguesa, a travessia do Atlântico mudou o significado do ato que os anglo-saxões descrevem como retirada.

Para os portugueses, a saída é reforma. Transformação, que significa mudança.

Esperança que a vida vai ser diferente, aperfeiçoada, melhor do que era antes.

No país de Macunaíma e dos berços esplêndidos,  aposentadoria, arrancada do Latim, é pouso.  Uma parada para repouso.

Ai, que preguiça!

O aumento da expectativa de vida  provoca discussões sobre a  prorrogação da longevidade profissional.

Quando o consenso, respeitadas as peculiaridades e culturas dos povos, já estava sendo alcançado, veio a pandemia.

A retirada, a reforma e a pausa para o repouso foram mandatórios, involuntários e não discriminou idades.

O período de provações, cumprido com mais rigor por mais de meio ano, serviu de estágio e amostra das novas relações de trabalho.

Muitas não serão as mesmas. Estima-se que até 40% das pessoas que passaram a trabalhar em casa, continuarão em home office. Muitos, cumprindo carga horária híbrida. Outros, serão remunerados pelo que produzem à distância, sem vigilância nem controles.

Os noticiários das redes de TV já estão adaptados. Comentaristas trocaram de estúdios e nos domésticos, conseguem manter a credibilidade e a audiência.

O aprendizado remoto deu saltos e a velha escola nunca mais será tão risonha e franca.

As maiores e mais tradicionais universidades do mundo já anunciaram que o próximo ano letivo será ministrado sem aulas presenciais.

A assistência médica também não é mais a de sempre. A telemedicina ganhou aceitação, conquistou novos espaços e é praticada, esperando novas regulamentações.

A tendência é que não só as aposentadorias sejam apressadas, o que sobrecarregará ainda mais os sistemas de previdência, como quem deixar uma profissão, não vai parar de produzir.

Os exemplos são muitos.

O maior, vem de longe.

Foi aos 78 anos que o senador retirado Joe Biden engatou uma nova atividade.

E não fiquem esperando que Trump vá passar o resto da vida jogando golfe…

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Quando publicado,  o texto refletia o sentimento de quem estava  pendurando o beniquê, instrumento de ganha-pão de todo urologista das antigas.

Um ano depois, a reação do neto a uma foto do avô, em rede esplêndida, é a descrição mais fiel dos encostados na previdência social:

Oi vovô, não fale mal de mim, não.

(O nonno havia comentado, carinhosamente,  uma postagem do saudável  comensal, de prato kid raspado, como “esmeril da França’”)

O nipote de seis anos entendeu a analogia, mas recebeu o elogio como crítica, e não respeitou a antiguidade, nem a hierarquia do alto posto familiar, para seu comentário insolente:

Eu estudo. Não sou como você não.

Não trabalha, só lendo jornal.

Vai na fazenda, manda os outros trabalhar.

Numa boa

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Bernard Safran (1924/1995) ilustrador norte-americano, pintou retratos realistas e cenas da vida cotidiana em Nova Iorque.

Autor de inúmeras capas de livros populares de faroeste e mistério, ficou mais conhecido pelos trabalhos para a revista Time.

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