6 de maio de 2024
Memória

RECONTO DA HISTÓRIA DOS ATOS SEM CONTRIÇÃO

 

Valentina de Milão chora a morte de seu marido, o Duque de Orléans (1802) – Fleury François Richard – Museu Hermitage, São Petersburgo, Rússia


Não faltou nem a declaração de isenção de conflito de interesses.

O autor responsável pela submissão do textículo  intitulado “Atos sem contrição”, declarou aos leitores e a quem mais interessasse, não possuir desavenças pessoais, comerciais, financeiras, acadêmicas, políticas, partidárias nem ideológicas, no assunto que tratava o manuscrito, publicado há dois anos, no apogeu da segunda onda da pandemia.

Declarou também que todas as informações que poderiam levar a uma possível desconformidade eram do conhecimento público, por tratar-se o autor, de médico em processo de aposentadoria, preocupado com a preservação da prática da Medicina liberal, baseada na Ciência e na Arte de curar.

Dos fatos:

O registro da inimaginável, vergonhosa e trágica marca das 500 mil mortes de brasileiros e brasileiras pela pandemia, estava sendo acompanhado de acontecimentos que mereciam desapaixonada reflexão.

As manifestações coletivas ocorridas em todo o país não representavam as dores de cada um.

Não multiplicavam por cinco centenas, os milhares de prantos calados, reservados,  distantes dos últimos adeuses.

Como evento previsível, qual um milésimo gol de um craque do futebol, a data provável havia sido precedida de contagem regressiva, tendo faltado somente no momento exato, a breaking news do plantão da redação, registrando o enterro de fatídico número, qual  nascimento do primeiro bebê, em ano novo.

Foram ouvidos minutos de silêncio em estádios então mudos, pela ausência  das torcidas.

As pessoas não foram chamadas para se ajoelhar nas ruas da diocese potiguara, como estavam  fazendo atletas antes das competições, mundo afora.

Ninguém marcou hora para  rezar  um padre-nosso coletivo, nas sacadas dos edifícios.

As luzes não foram apagadas, todas ao mesmo tempo.

A quietude sepucral quebrada com vituperiosas batidas de panelas e brados de anacrônicos slogans, não remetia a sentimentos de pesar e saudade.

Os sinos das igrejas repicaram sem que fossem celebradas liturgias cristãs de exéquias.

As bandeiras desfraldadas, tintas em vermelho rutilante, demonstravam que o ódio haveria de vencer o luto.

A presença de celebridades, artistas,  políticos e formadores de opinião, nas redes sociais, com mensagens de sentimentos, pêsames e condolências, não escondiam a motivação maior de acusar o governo, pela sinistra efeméride.

Já se podia prever que os erros do passado seriam condenados, nos tribunais e nas eleições.

Agora, a História começa a contar o que realmente estava acontecendo.

A Morte do Príncipe de Talmont (1823) – Fleury François Richard – Centro de Artes Cantor, Universidade de Stanford, Califórnia, Estados Unidos

 

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *