TRETA CONDENSADA
Há um ano, acabou em doce frustração, a notícia que poderia dispensar todos os trâmites e ritos no parlamento, e apressado o impeachment do Presidente da República.
Um escândalo, sem explicações, um verdadeiro flagrante-delito, merece passar pelo crivo do tempo.
A denúncia de gastos de 15 milhões de reais com leite condensado, deixava qualquer pedalada no chinelo.
A extrema-imprensa e os lacradores em geral se apressaram a espanar a poeira das facits, para publicar em números, o tamanho do escarcéu.
Quem seria capaz de consumir, em um ano, mais de 2,8 milhões de latinhas de Leite Moça, se compradas cada uma a 5,29 reais (preço de janeiro de 2021), no Nordestão da Salgado Filho?
Não adiantaram as explicações oficiais.
Que os valores nas gôndolas do Portal da Transparência representavam o somatório de todas as compras do governo federal.
Abastecimento das forças armadas, universidades e seus restaurantes, institutos federais, hospitais, presídios, escolas, repartições e também, as dispensas das residências oficias.
Nem Mourão do Jaburu pode dizer que daquele leite não bebeu.
A salinha da copa do Palácio do Planalto entrou na conta e ganhou toda a fama do festim.
E ficaram no ar outras perguntas.
Quantos brigadeiros Dona Michelle conseguia enrolar na cozinha da primeira família?
Quantas latinhas caberiam enfiadas no rabo da imprensa, destinação sugerida pelo cordato capitão-presidente, sob aplausos do finíssimo chanceler que logo depois, virou pária?
As dulcíssimas cenas dos cafés da manhã, na pré-temporada presidencial, no Vivendas da Barra, estavam vivas na memória.
Uma mesa sem toalha, forrada de farelo e restos de pão, talheres espalhados, uma garrafa térmica, de plástico (Invicta) e a inconfundível latinha de leite condensado, fizeram do candidato eleito, o mais popularesco chefe de governo de transição, como nunca neste país, jamais houve.
Para justificar tanto consumo, só se o ritual de deixar o espesso creme escorrer na banda do pão francês, tivesse se transformado em vício.
Até assumir a forma melequenta, mantendo o mesmo nome do precioso líquido branco, e servir de assunto para editorial de jornalão, o que se ordenha do úbere da vaca e se enlata, percorreu uma longa história.
Data do início do século XIX a procura por um processo que conservasse a bebida que todos se acostumaram a buscar na fonte, nos seios maternos, para depois de velhos, descobrirem-se intolerantes à lactose.
A retirada parcial da água e a adição de açúcar, associadas às técnicas de esterilização e embalagem que surgiam, tornaram as latinhas que hoje contêm 395 g, um sucesso duradouro.
Guardando intactas as características e gosto, não faltou na dieta dos soldados em todas as guerras, começando pela da Secessão.
O presidente acidental deve ter adquirido o hábito na caserna, entre um salto e outro, nas comemorações das aberturas dos paraquedas.
Daí se dizer que lambuza toneladas no pãozinho francês, vai um imenso exagero.
Quem divulgou e repetiu a informação sobejada, não recorreu antes, às agências de fact-checking, nem corrigiu, depois, o desmedido buxixo
A velocidade como os assuntos mudam de posição no ranking e nos trending topics, já estava a exigir matéria mais nova. E estapafúrdia.
O perigo agora, depois que a “operação especial” de Putin na Ucrânia cessar-fogo, é que a imprensa investigativa resolva medir em centímetros ou metros, todo o papel higiênico comprado para uso no traseiro presidencial.
O urologista está obrando cada vez melhor. Se eu disser escrevendo o site reclama.