4 de maio de 2024
Política

TRETA CONDENSADA

 

01B60485-C179-466C-BCC2-3D4D06E58505
A Leiteira (1660) – Johannes Vermeer – Rijksmuseum, Amsterdã


Há um ano, acabou em doce frustração, a notícia que poderia dispensar todos os trâmites e ritos no parlamento, e apressado o impeachment do
Presidente da República.

Um escândalo, sem explicações, um verdadeiro flagrante-delito, merece passar pelo crivo do tempo.

A denúncia de gastos de  15 milhões de reais com leite condensado, deixava qualquer pedalada no chinelo.

A extrema-imprensa e os lacradores em geral se apressaram a espanar a poeira das facits, para publicar em números, o tamanho do escarcéu.

Quem seria capaz de consumir, em um ano, mais de 2,8 milhões de latinhas de Leite Moça, se compradas cada uma a 5,29 reais (preço de janeiro de 2021), no Nordestão da Salgado Filho?

Não adiantaram as explicações oficiais.

Que os valores nas gôndolas do Portal da Transparência representavam o somatório de todas as compras do governo federal.

Abastecimento das forças armadas, universidades e seus restaurantes,  institutos federais, hospitais, presídios, escolas, repartições e também, as dispensas das residências oficias.

Nem Mourão do Jaburu pode dizer que daquele leite não bebeu.

A salinha da copa do Palácio do Planalto entrou na conta e ganhou toda a fama do festim.

E ficaram no ar outras perguntas.

Quantos brigadeiros Dona Michelle conseguia enrolar  na cozinha da primeira família?

Quantas latinhas caberiam enfiadas no rabo da imprensa, destinação sugerida pelo cordato capitão-presidente, sob aplausos do finíssimo chanceler que logo depois, virou pária?

As dulcíssimas cenas dos cafés da manhã, na pré-temporada presidencial, no Vivendas da Barra, estavam vivas na memória.

Uma mesa sem toalha, forrada de farelo e restos de pão, talheres espalhados, uma  garrafa térmica, de plástico (Invicta)  e a inconfundível latinha de leite condensado, fizeram do candidato eleito, o mais popularesco chefe de governo de transição, como nunca neste país, jamais houve.

Para justificar tanto consumo, só se o ritual de deixar o espesso creme escorrer na banda do pão francês, tivesse se transformado em vício.

Até assumir a forma melequenta, mantendo o mesmo nome do precioso líquido branco,  e servir de assunto para editorial de jornalão, o que se ordenha do úbere da vaca e se enlata, percorreu  uma longa história.

Data do início do século XIX a procura por um processo que conservasse a bebida que todos se acostumaram a buscar na fonte, nos seios maternos,  para depois de velhos, descobrirem-se intolerantes à lactose.

A retirada parcial da água e a adição de açúcar, associadas às técnicas de esterilização e embalagem que surgiam, tornaram as latinhas que hoje contêm 395 g, um sucesso duradouro.

Guardando intactas as características e gosto, não faltou na dieta dos soldados em todas as guerras, começando pela da Secessão.

O presidente acidental deve ter adquirido o hábito na caserna, entre um salto e outro, nas comemorações das aberturas dos paraquedas.

Daí se dizer que lambuza toneladas no pãozinho francês, vai um imenso exagero.

Quem divulgou e repetiu a informação sobejada, não recorreu antes, às agências de fact-checking, nem  corrigiu, depois, o desmedido buxixo

A velocidade como os assuntos mudam de posição no ranking e nos trending topics, já estava a exigir matéria mais nova. E estapafúrdia.

O perigo agora, depois que a “operação especial” de Putin na Ucrânia cessar-fogo, é que a imprensa investigativa resolva medir em centímetros ou metros, todo o papel higiênico comprado para uso no traseiro presidencial.

6C8F6402-714E-4815-AC1D-7F281C655824
Moça dormindo (1657) – Johannes Vermeer – Metropolitan Museum of Art, MoMa, Nova Iorque

One thought on “TRETA CONDENSADA

  • GERALDO Batista de Araújo

    O urologista está obrando cada vez melhor. Se eu disser escrevendo o site reclama.

    Resposta

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *