VIDA NADA FÁCIL
Protegidos no habitat natural, convivendo com os pares, recebendo os mais altos salários, cercado de assessores, vigiados pela câmeras de TV, dispondo de polícia particular e inimagináveis mordomias, a vida parece fácil.
Muitos invejam.
Quando voltam às bases, podem dispor ainda um pouco do que deixam em Brasília.
Frequentam sempre ambientes amistosos, o assédio da imprensa é cordial e um bando de aspones, diligentes e operadores, não os deixam sós.
Há contudo, um problema que nem a física quântica resolve.
Como se deslocar de A para B, sem empecilhos, nem dissabores no caminho.
Há muito que a inércia deixou de existir. Desde que passaram a dizer que pobre anda de avião e empregada doméstica viaja para o outro mundo, Disney World é aqui.
A depender do assunto em destaque nas redes sociais, com repercussão nas mídias tradicionais, os embarques e desembarques podem virar estresses, constrangimentos e rebus.
E até por trás das portas das aeronaves, em automático, uma afoiteza de anônimo passageiro pode virar agressão verbal, contagiante como o vírus da moda.
Vale para qualquer outra oportunidade de contato com o público, fora do ambiente político e longe da fauna comensal.
O trajeto entre o apartamento e a recepção do hotel cinco estrela, percorrido pela ex-senadora e deputada federal, transformou a área de lazer, em piscinão de Ramos. Muvuca e bate-boca gravados, postados, compartilhados.
Com muitos likes, o perrengue revelou um novo casal de famosos.
O 20 do 13.
Tais incidentes sempre começam com um pedido de justificativa, em modo agressivo, para posicionamentos tornados públicos e terminam com incursões pelas jóias do pensamento ideológico.
De lá, de cá, pra cada e todo lado. Alto e em mal tom.
Comunista! Fascista! Petralha! Miliciano! Homofóbico! Reaça!
Passando pelos artigos 155 e 157 do código penal, o diálogo franco sempre termina com a clássica tríade: V **** C **** FDP.
E ameaças de chamar a polícia e acionar a justiça.
Quem pode, recorre ao anonimato das subidas e descidas, em outros estados vizinhos, com o argumento de horários de vôos mais adequados e até, se o peroba não estiver vencido, pelo atrativo dos preços das passagens. a que têm direito, grátis e abundante.
Senador de terceiro mandato, já tendo sido deputado federal, o ex-metalúrgico e sindicalista descobriu um método infalível de não ser importunado no aeroporto da sua Canoas.
Nesta fase deprê do partido que ajudou a criar, trocou o notável currículo contruído nos estatutos do idoso e da pessoa com necessidades especiais, de defensor dos trabalhadores e o ermenegildo zegna por um estilo mais casual.
Ficou de irreconhecível a invisível.
Jeans desgastados, modelo retrô, tênis surrados e camiseta pedindo aposentadoria a quem entende bem do assunto.
Com o boné, sem marcas nem mensagens, enterrado até onde pôde, fones nos ouvidos, olhos grelados no smartphone e paciência para esperar, num canto do salão, o fim das filas, por ninguém foi importunado.
Sem ser abordado, notado nem reconhecido, fez uma boa e solitária viagem.
Continuo gostando.digo isso mesmo sabendo qui o tal de site vai dizer: “Você já disse isso anteriormente.” E daí, não tenho liberdade de repetir nada? Velho fala as mesmas coisas 200 vezes.