7 de maio de 2024
CoronavírusMemória

A VACINA DE LAURITA

Menina (1913) – Joaquín Sorolla Museu Nacional de Belas Artes, Havana, Cuba


Enquanto a população do
Rio de Janeiro, em pânico, comentava o aparecimento de uma nova doença, as autoridades sanitárias negavam a gravidade da notória situação.

Seriam casos isolados.

A manchete do Correia da Manhã no primeiro dia do ano de 1953, era tranquilizadora:

Não há surto de paralisia infantil.”

O avanço da contaminação foi inescondível.

Com o espírito de Oswaldo Cruz redivivo, muitas casas foram dedetizadas para  erradicar algum inseto vetor – inexistente – que estivesse transmitindo a doença.

Pelas estradas esburacadas e nas asas da Panair, a moléstia se espalhou pelo país.

Até que as vacinas estivessem disponíveis, o número de sequelados aumentava a vergonhosa contabilidade.

Em 1955, o imunizante injetável passou a ser usado.

Para poucos.

Somente com a chegada da forma oral, seis anos depois, a vacinação em gotinhas começou para todos.

Abrindo mão de patentes e direitos autorais, o Professor Albert Sabin, polonês, imigrante para os Estados Unidos, doou à humanidade o seu trabalho, conhecimento e a erradicação do terrível mal.

Não há como deixar de  comparar com o novo vírus que a todos amedronta.

Na falta de tratamento eficaz, medidas higiênicas e distanciamento social diminuem o ritmo da propagação, até que a droga milagrosa que produz defesas individuais contra os invasores, chegue a todos.

A geração dos baby boomers, no pós guerra, foi a maior vítima da virose mutiladora.

Cada família ficou marcada com uma  triste história pra contar.

Cidades sem água tratada, transportada em precários barris, em lombo de jumentos, sem esgotamento sanitário, era o ambiente ideal para a proliferação da poliomielite.

Ao lembrar a  irmã que partiu há cinquenta anos (estaria completando 75), o inevitável paralelo.

Adoecida aos 8, viveu mais 16 com a deformidade física, muletas, cadeiras de rodas, o grande mal epiléptico e perturbações mentais.

Em todo aniversário, na comemoração,  não faltava seu riso debochado com o prognóstico do professor-doutor-catedrático, neurologista carioca, que havia estimado o limite da  sua vida ao início da adolescência.

Acreditava que as cirurgias experimentais que prometiam fantásticos resultados no Canadá, estariam resolvendo seu problema, muito mais perto. No Recife, por exemplo.

Com o pai, procurou a cura nos melhores consultórios médicos e nos mais confiáveis terreiros de todas as religiões, de todas as crenças.

A história da doença atual também será contada com saudade e tristeza.

Resta a esperança que a vida será melhor para quem vier depois da tormenta.

Meninos na praia (1910), Joaquín Sorolla – Casarão do Bom Retiro do Museu do Prado – Madri, Espanha

Álbum de Família 

Laurita e seu afilhado de apresentação, Domicio

           Leonardo, Laurita e Cassiano
             Leonardo, Terezinha Batista, Domicio e Laurita, 


(Texto publicado em 21/02/2021, um dia depois do início da vacinação contra a Covid em Natal)

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