27 de abril de 2024
Coronavírus

O CANTO DO GALO

 

Hipócrates, ao descrever as crises de gota, não sabia suas causas,  mas profetizou quando os doentes apresentariam a fase mais aguda. Antes do primum galli cantum.

O galo ainda não havia  cantado e Pedro, por três vezes,  negara  conhecer seu guia espiritual.

O mestre e depois de quatro séculos, o mestre dos mestres, sabiam que  o tronido despertador romperia o silêncio, anunciando o novo dia.

Até hoje nenhum cientista respondeu com exatidão porque cantam os galináceos.

A ciência multiplicou horizontes e conhecimentos mas ainda convive com muitos mistérios.

Os galos continuaram cantando e fazendo festa, em desafio ao toque de recolher determinado pelos comitês científicos e mais altas autoridades sanitárias.

O médico de uma penitenciária com mais de 2000 apenados, divulgou dados coletados em um ano de pandemia, com os resultados das  medidas tomadas  para evitar uma tragédia anunciada, nas masmorras de outra maior.

Pessoas que convivem em ambientes fechados, portadores de múltiplas comorbidades. Vítimas prováveis entre os grupos de risco de contaminação.

Enquanto a megavirose avançava, serviços médicos e hospitais já não tinham espaço para atender e os números dos mortos causavam terror, no seu campo de trabalho e posto de observação, não havia constatado nenhum óbito.

Não houve necessidade de uma só internação.

Seguindo raciocínio e método científico observacional, concluiu que entre inúmeras variáveis, uma era comum.

Todos que vinham fazendo uso regular de determinada medicação, com fins profiláticos das parasitoses comunitárias, repetiam a resistência  mostrada  em prévias doenças sazonais.

A proteção que poderia ajudar outros, foi duramente questionada, negada por falta de comprovação e chancela dos doutores do saber, como pajelança que dilapida o patrimônio público.

Denunciado, o facultativo respondeu a processo criminal.

A campanha contra o medicamento de baixo custo ganhou os mais nobres espaços da mídia e transformou uma droga lícita que tem salvo milhões de vidas miseráveis, tendo conferido aos seus descobridores, um Prêmio Nobel de Medicina, na mais apedrejada e escarrada Geni, num país de muita saúva e pouca saúde.

Não faltaram doutos sapientes que nunca trataram lombrigas nem chanha,  para alarmarem efeitos adversos catastróficos.

O outro lado da notícia não apurou quantas hepatites fulminantes vitimaram os desnutridos, diabéticos, hipertensos, aidéticos e tuberculosos internos.

Nem somou os inscritos nas filas para transplante de fígado.

Mesmo depois que  todos forem vacinados, o canto do galo vai continuar sendo ouvido a cada madrugada, duas horas antes do sol nascer.

Aviso que a noite escura ainda não acabou.

 

(Publicação original em 06/04/2021)

 

2 thoughts on “O CANTO DO GALO

  • O galo sempre presente na vida de alguns da aldeia. Lembro o galo do Convento e Igreja de santos Antônio, de um galo rei de um galinheiro, do galo de Dona Nenem ceramista, reinventado pelas mãos hábeis de Carlos José em tons de azul. São bonitos os que vc postou. Hoje excepcionalmente estou comentando sobre algum assunto que tocou a minha alma. Boa semana. Vc tem se revelado como escritor.

    Resposta

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *