4 de maio de 2024
Memória

VOVÔ DE FRALDA

A verdade (1870) – Jules Lefebvre – Museu de Orsay, Paris


Que drogas hipnóticas são essenciais na indução anestésica,  e sem elas a entubação traqueal é quase impossível, qualquer estudante bolivariano, de uma dessas faculdades de medicina de fronteira, sabe.

Em tempos de fakenews, a procura do soro da verdade está no ar.

É tech.

É pop.

É ciência anti-terraplana.

Num passado que fica cada vez mais remoto ao se aproximar o 60° aniversário dos acontecimentos, contam que depois do pau de arara não havia  melhor remédio para soltar a língua dos que subvertiam a ordem estabelecida defendida por todos os  jornalões e  unanimidade das emissoras de TV, que uma dose cavalar de  tiopental sódico na veia.

Registram que o primeiro soro da verdade foi utilizado no início do século passado. 

Um obstetra norte-americano observou que as  mulheres em trabalho de parto falavam sinceramente sobre vários assuntos, quando anestesiadas com escopolamina.

Em 1922, ele testou a droga em dois suspeitos de um crime, que negaram as acusações e foram inocentados.

Nossos companheiros de BRICS, os indianos, também negam, mas são frequentes e críveis as denúncias de aplicação policial de drogas hipnóticas em algumas regiões do país emergente.

Para quem só conta segredos  na expressão latina que vem de Plínio, o velho grego, “in vino veritas”, o perigo mora numa sala de recuperação anestésica.

Mas é necessária a presença de uma testemunha boquirrota, de preferência um filho médico que tenha filhos que há muito aboliram a censura e a distância hierárquica do avô.

A quase centenária sonda vesical de permanência, Foley para os íntimos, é peça fundamental no pós-operatório das mais modernas e tecnológicas prostatectomias radicais robóticas.

Podem – e agora está provado – desencadear lancinantes dores no abdômen, apesar do eufemismo médico tratá-las como desconforto.

Os relatos são de um despertar tumultuado.

Depois de não se conformar com as explicações do paciente enfermeiro, ainda zonzo, o recém-operado, desconfiado que a lavagem intestinal não fora completamente eficaz, fez, aos brados um alerta para que fosse levado logo ao banheiro.

Agora, os netos têm uma nova saudação para os encontros com o avô-cagão:

Meu companheiro, vai acontecer um desastre !   Meu companheiro, vai acontecer  um desastre !

Nenhuma tragédia, que uma fralda geriátrica não tenha resolvido.

Menino pintando uma máscara trágica (1863) – Jules Joseph Lefebvre – Coleção privada

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