27 de abril de 2024
Memória

DE VOLTA AO PARAÍSO

A Paixão da Criação (1899) Leonid Pasternak


Não dá pra contar quantos professores se tem ao longo da vida.

Com o passar do tempo, vão sendo esquecidos, e poucos são lembrados, 55 anos depois.

Vez por outra, em conversas com antigos colegas, vem à memória, algum especial.

Não, por nos ter ensinado matéria específica, de conteúdo técnico e importante para uma futura profissão, mas quem  dava os primeiros conselhos para a vida real.

Professor Amadeu, de Português,  seria considerado hoje, um homem maduro.

Cinquentão.

Para quem estava na terceira série ginasial, já era um velho,  dobrando o cabo de são roque.

Baixinho e mais pra gordo, chegava sempre meio cansado, derrubava a pasta surrada em qualquer lugar, sentava-se ao birô (estará certo o emprego deste adjunto adnominal?) e logo no começo da aula, chamava sempre o mesmo involuntário à lousa.

Ditava a lição, e o pupilo, por ter boa caligrafia, acompanhava-o no chiado do giz.

Reclamações frequentes, por qualquer demora ou se um cê-cedilha entrasse no lugar de um dois-esses.

A bronca vinha em forma de cara feia, ou uma coçada impaciente na avançada calva, provocando risos da plateia, quando, de bullying, não se falava.

Em anos AX (Antes da Xerox), o auxiliar de professor se virava para copiar, de algum caderno emprestado, tudo outra vez.

Quando a turma, com fama de ser quase toda de filhinhos do papai, demonstrava pouco interesse, vinha a reprimenda, em forma de alerta, que o tempo mostrou ser lição tão verdadeira:

Não se iludam, rapazes.                            O paraíso não fica ali, por trás dos muros do Colégio Santo Antônio.


N.R.

Aos leitores mais jovens:

1.

Até o início dos anos 70, o Colégio Marista, e todos os demais religiosos, eram unissex.

2.

O anglicismo ‘unissex’, adjetivo comum de dois gêneros, não flexiona em número.

 

A noite antes do exame (1935) – Leonid Pasternak – Museu de Orsay, Paris

***
Leonid Osipovich Pasternak (1862-1945), pintor e artista gráfico russo de origem judaica, nasceu em Odessa, hoje Ucrânia. e foi um mestre da ilustração de livros.

Seu filho, Boris, autor do clássico (também no cinema) Doutor Jivago,  ganhador  do Prêmio Nobel de Literatura de 1958,  foi proibido de receber a honraria.

Mas isso, é a mesma história de uma guerra insana.

(Esta aula foi proferida originalmente  em 25/04/2019)

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