O NOVO CANGAÇO
Vilas e cidadezinhas bucólicas, do tempo dos nossos avós, são apenas lembranças em fotos manchadas, nos álbuns quase esquecidos.
Em qualquer lugar, por mais remoto e tranquilo, o crime se instalou.
Com frequência, variedade e constância.
Não se fazem mais ladrões de galinhas como antigamente.
Seguindo o rastro dos caminhões trucados, vieram a prostituição infantojuvenil e as drogas.
Depois, pelas veredas e estradas de terra-batida, menos a lombo de cavalo, e mais em motocicletas de muitas cilindradas, outros malfeitos chegam aos rincões e pés de serra.
Novas relações trabalhistas e programas de transferência de renda, esvaziam propriedades rurais e incham, não só as grandes, mas também as periferias das pequenas.
Coreias, vietnams, leningrados, sopapos, malvinas, rabos das gatas, são as novas fronteiras da delinquência.
A população ao deus-dará e à pouca sorte.
Aos jovens com limitadas instrução, renda e oportunidades, resta o ócio.
O pai de todos os vícios, e maior empregador rural.
Não se conversa mais sobre vida campestre, variações do clima, o bonito pra chover, plantio, colheita, animais e festas dos santos.
Predominam notícias de assaltos, medos, invasões, roubos, tiroteios, explosões de bancos e agências dos correios.
A vida ficou complicada e mais perigosa.
Os novos cangaços, do asfalto e do piçarro, transferiram a audiência do Globo Rural para turbinar o ibope do Papinha.
Força policial inoperante, desaparelhada e insuficiente, é convite, gravado em letras douradas, para a talionato e a formação de milícias.
A troca de um crime por outro, aparece como única e esperada solução, fundada na trinca, salve-se quem puder, auto-defesa e a culpa concorrente da vítima.
Na estradinha carroçavel, caminho de pequenos sítios, um caso de duplo estupro desnuda o sentimento de impotência e conformismo:
É nisso que dá.
Uma moto, duas moças.
Outra moto, dois rapazes.
Um trabuco.
Shortinhos na moda.
O meio do nada.
Dois soldados e nenhum cabo.
No cenário da caatinga, o Dragão da Maldade já está preparado para o Amargedom .
Será batalha de morte.
Só o Santo Guerreiro pode nos salvar.
(Com modificações, este texto foi publicado em 3/7/2019, sob o título, Crime na Caatinga)
O “aprendiz” está mais para professor. Acho que ele aprendeu lendo o grande Graciliano Ramos, um dos meus preferidos. Parabéns de vera.