1 de maio de 2024
Memória

TRÊS VEZES SANTANA

Cena Familiar (1969) – Fernando Botero – Museu Coleção Berardo, Lisboa


Na Macondo do Agreste,  a das lembranças da criança que já completou 70 anos, as casas também eram de barro e taquara.

E de tijolo, taipa e pau-a-pique.

O rio de águas nem tão diáfanas,  quando corre de barreira a barreira, ainda junta gente pra ver.

Personagens inesquecíveis,  cheios de cores e vida.

Digno da galeria de Gabriel Garcia Márquez, foi só relembrar sua prodigiosa memória, para despertar na de outros conterrâneos, passagens protagonizadas por Alfredo Augusto de Santana, que são repetidas para não caírem no  esquecimento.

Perde-Ganha

Um corretor depois de vender títulos de capitalização a todos os comerciantes da rua grande, fez plantão sob a sombra, no oitão da igreja, até conseguir encontrar o investidor em potencial.                                 

Depois de usar  os mesmos argumentos que funcionaram em todas as paradas da Great Western Railroads, desde o Recife, ouviu o desafio:

Se o banco, você e eu vamos ganhar dinheiro com este negócio, só compro quando ficar sabendo quem vai perder.

Crédito intestinal

Com um desarranjo que não o deixava sair de casa e da casinha, mandou  um xeleléu comprar papel higiênico.

Sem levar dinheiro.                            

O dono do armazém, conhecido mão-de-vaca,  seguia à risca  o aviso pregado na parede:

Fiado só amanhã.

Mandou de volta a desculpa esfarrapada que o produto estava em falta e só chegaria em alguns  dias.

É pra ficar acabando pelo fundo, feito um balaio, e só vá me limpar na semana que entra?                          

O Casamento da Virgem

Quando a donzela sob sua tutela começou a levar falta nos louvores à padroeira, a Imaculada Conceição, teve quem notasse.

E alertado.

Certo que a eterna vigilância era a régua da liberdade, os cuidados foram redobrados.

Ao saber de um passeio não autorizado, em companhia varonil, por caminhos que não deixam rastros, chamou aos carretéis, o jovem que já havia notado pelos arredores, de asas (e quem iria saber, o que mais) levantadas.    

Instaurou um inquérito rigoroso e privativo.

O mancebo a tudo respondeu.                                   

O footing, de fato, ocorreu.

Houve beijos?
Tímidos.                               

Corpos desnudos?                                                       Sim.                           

Chegaram  aos finalmentes?
Negou sem muita firmeza.

Pois você é um cabra muito frouxo.
Se fosse eu, nunca iria perder uma oportunidade dessas.

A Rua (1987) – Fernando Botero – Galeria Marlborough, Madri


(Publicação original em 05/07/2019)

 

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