VOTO DE FUTURO
Há um ano a Câmara dos Deputados rejeitou o projeto de emenda constitucional que restabelecia o voto (também) impresso.
A 42 dias das eleições, o assunto ainda desperta polêmica, emoções e assanha um pelotão de saudosistas.
Parece até que a pandemia não mostrou que há mais coisas entre o céu e a blogosfera do que pode imaginar nossa vã política.
Muitos ainda não perceberam que a vida agora corre nas veias dos cabos de fibra ótica e por infovias misteriosas, e que nada será como antes, sem talvez.
O próprio parlamento já mostrou que grandes decisões podem ser tomadas a distância, sem prejuízos, sem cochichos.
Basta trocar a pressão das galerias e lobistas, pelo sentimento do eleitor mais próximo.
Sai o saguão do aeroporto, entra o balcão da padaria, como lugar de encontro entre representantes e representados.
Ninguém precisa esperar pelo futuro. Ele chega sem tardar, não bate à porta, nem aperta campainha.
No universo tecnológico, a máquina do tempo não viaja para o passado.
Se o quadradinho luminoso que todos têm sempre à mão, já substitui até o papel moeda; se o dinheiro troca de bolsos no estalar de um pix, como chorar o leite derramado pelas brejeiras que não voltam mais?
As seguidas novidades eletrônicas fazem muitos se sentirem habitantes de Orbit City, vizinho da família Jetsons; outros, um autêntico Flintstone, em Bedrock.
Qualquer novidade precisa o que os novos gestores, gurus das inovações, coaches e mentores chamam de quebra de paradigmas.
Depois de uma campanha eleitoral eletrônica, por SMS ou e-mail, enviada uma senha por CPF cadastrado no TRE, é acessado o site-urna-junta apuradora.
Em poucos toques e segundos, o dever patriótico se completa, e o resultado instantâneo é aceito, com clareza e democracia.
Na última eleição presidencial na Lituânia, mais de um quarto dos votos foram remetidos por telefones móveis.
As proconsults, smartmatics, intercepts e outras eternas vigilâncias são os preços cobrados pela liberdade de escolher, em conforto e tranquilidade, quem nos governará.
De outros argumentos, não restam dúvidas.
Custos infinitamente menores.
Domingo, dia de orações, churrasco, praia e pernas pro ar.
O sufrágio obrigatório ou não, sem ninguém reclamar do trabalho que dá para anular o voto.
Um dia, os netos do capitão votarão assim.
E não se ouvirá mais a chatice do lenga lenga do voto auditável.